domingo, 27 de março de 2011

Utopia outonal.




(Nós vamos entrelaçar os pés nas manhãs refrescantes de outono, assistir lutas de madrugada na televisão, dar voltas intermináveis de carro pela cidade, fazer duetos de músicas bregas, viajar para as montanhas e sentir o ar gélido na ponta do nariz, vermelho. Dormirei com seu pijama, enquanto lhe empresto meus livros. Você me pedirá ajuda com os mapas, e no meu fracasso, uma pequena briga. Pela nossa cumplicidade tamanha, e ventura desvairada, curada logo em seguida, em cálidos beijos no pé do precipício: quando o infinito é sim, além. Haverá a busca dentro da chuva, no meio da noite, em que você me resgata da revolta dos dias de azar. Jantar à luz de velas, quando a eletricidade cessar sem tempo certo para voltar. Fotos tiradas apenas de nosso conhecimento. Abraços apertados no meio da cozinha. Dois celulares desligados.  Folhas de outono secas, presenteadas, no meio da agenda - recordação - disso que iniciamos viver e hesitamos nos beliscar, caso seja sonho e acordados sejamos para o regresso à realidade fria e crua, desmazelada, a que vivemos. Por enquanto, não. Brigamos em meio aos travesseiros, e ofegantes, cessamos os movimentos físicos para dar início às filosofias da fala. Rodopiamos por entre todos os assuntos do mundo, em nossos pensamentos comuns. Cozinharei, para que você lave a louça mais tarde. Tomaremos champanhe no bico, no mesmo gargalo, sem se importar se amanhã é quarta-feira ou segunda e a rotina nos chama. Venerarei com meus olhos detalhistas a nuca onde, por mim, faria moradia. O par de olhos no escuro, que é laterna e projeta no quarto reflexos da nossa brincadeira de ser casal, inconsumada. Os ombros largos, onde faço gosto de me resguardar inteira: sempre. E detestaremos tomares, exaltaremos chocolate e café de todos os tipos. No colo um do outro, divagações sobre as catástrofes mundiais, intermináveis e suscetíveis. Seu braço em torno do meu pescoço, no relampejo mas forte. Minhas mãos amaciando suas costas, depois dos dias cansativos. Pensar que o mundo que desconhece você, é uma parte da Via Láctea a não ser visitada; é infeliz. Desafabos sobre a vida moderna que nos atrela, no feriado que é cada um desses instantes mágicos, em dupla. Dançaremos ao frenesi do luar, na sacada mínima de onde você vive. Desejaremos o céu como rota. Compartilharemos sonhos em comum. Ter você pela manhã, querendo fazer parte do seu dia todo. Me entregar a você, de tardezinha, para que a noite seja nossa e prolongada. Das poucas horas juntos, faremos com que na marra, sejam estas intermináveis. Dos dias separados, uma saudade aumentada para que quando consumida, em conjunto, a intensidade do toque, dos gestos, das palavras, em nós atinja em cheio - e deixe avivado tudo aquilo até então, construído. Querer você mesmo suado, sem nojo, pudor ou culpa: de mãos dadas com o desejo. Escrever no seu espelho com batom antes de sairmos de casa. Beijar você do seu andar até o térreo, sem se dar conta que a porta abriu e o elevador chegou ao estacionamento. E principalmente, por desconhecer o que o futuro reserva, guardar tudo isso na memória, nas páginas mais bem decoradas e acessíveis para revisitar sempre, a qualquer hora. Como as folhas de outono no meio da agenda, aquelas que você me deu enquanto passeávamos com o cachorro no parque perto aqui de casa).
É quando ele sai do banho e me vê pensativa olhando na janela a chuva fina que cai e nos pegará em instantes, em mais essa manhã de palavras poucas e resmungos significativos. Indaga:
- O que é que você tá pensando aí, quieta?
- Nada. Começou mais um outono, só isso. Vem pra cá enquanto o tempo é nosso.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Não tenho roupa.


O armário lotado parece murmurar: hoje não, não tem roupa. Eu, que pela vontade própria vestiria o dia inteiro pijama se em casa ficasse, penso na possibilidade - que minutos depois, avalio como inexistente, infelizmente. Dentre a bagunça das peças reviradas, ao avesso, atrolhadas na cama, desordenadas, a sensação de que nada vestiria por completo o humor que carrego e pertenço ao acordar, e desde cedo o mundo deve saber. A manhã acorda e raia o sol, enquanto o tempo parece correr e minutos se tornam segundos. A pressa toma conta dos atos, a desgovernança da tranquilidade matutina, ilustre lugar da paz. Há uma maestria na ordem do sumiço dentro do roupeiro, as portas certas se fecham, quando deveriam abrir, e a blusa correta, junto com aquela saia, se refugia no lugar mais improvável que nosso olhar, mãos e desespero vasculham. Macaquinhos procurados no verão reaparecem, fantasias para possíveis festas à fantasia ou halloween se redescobrem. E nada da mistura explosiva que necessito exibir. Insatisfeita e com a sensação de monstra do dia, feia do mês, e brega do ano (concorrente à todas as estatuetas do Oscar das mal vestidas) lá vou eu mostrar pro mundo esse lado descombinado que nem mesmo sabia existir nos dias ruins.

Ele liga e pergunta se quero jantar fora. Murmuro baixo, para que não ouçam. Aceito, e mascaro a felicidade latente, para contar apenas a quem perceber. Em casa, o drama de dias atrás, daquela semana passada, de uma vida inteira reaparece com força estrondosa. Ressurgido das cinzas, como quem me diz: desista de comprar todas as calça jeans bem ajustadas, vestidos de altura certa e blusinhas coringas do Universo, para hoje você não tem roupa. Xingo a diarista, que de certo, deve ter escondido numa intuição de saber que precisaria eu, mais tarde, justamente de tal indumentária. Até mesmo metida dentro das gavetas, quem sabe em Nárnia, algum achado que não estas simplicidades que provo, provo, e desgosto. Resolvo começar o look pelo sapato, aquele novo. Vestido e colete, que troca e vira vestido com jaqueta, que despe e troca por saia jeans e blusinha preta; mais básica impossível. É assim que vou, e pronto - se ele me quiser, que seja sem esses artefatos têxteis que nada dizem, e ao mesmo tempo nos entregam. Roupa é complemento, penso. Sapato sim, é necessidade feminina, concluo. E com a bolsa recém adquirida, lá desço eu para esperar o cara que me ligou e disse já estar aqui na frente, espero que me ache gata mesmo no dia em que me sinto apenas borralheira.

Entrevista de emprego. O que vestir para passar sobriedade, e também, jovialidade? Como me mostrar responsável, e deixar a sensualidade, o glamour e feminilidade em casa? Complicado. Paciência, peço a mim mesma. Voraz, me vejo bagunçando novamente as dobradiças impecáveis que construí ontem à tarde, num momento de parcimônia e inquietude. Terninho, e depois calça jeans. Saia alta, bata, botas, scarpin. E nada. Me pego sentada, de calcinha, sutiã (ambos singulares, desconjuntados) na cama, como quem quer chorar mas não vai estragar o make. Mãe, não tenho roupa. Linda de qualquer jeito, ela diz. Mas vai simples, completa. Sem brilho e cor demais, esquece o xadrez e o salto alto. Sapatilha, vestido simples e casaqueto, me vou. Saio como quem quis ficar, incompetente de combinar o que compro.

Ócio puro. Uma tarde vazia que se decorre do sofá para a mesa da sala, das escadas, para a cama no meu quarto. Resolvo brincar de estilista própria, e provo metade do meu armário - quase explodido. Acho combinações perfeitas pra tudo que é ocasião, e prometo vestir algum dia. Outro qualquer que o inconsciente grave, e lá adiante, apenas pegue o vestuário certo, sem deixar que me consuma um pingo de indecisão. Sabendo que, pela frente, muitos outros dias em que terei todas as vestes do mundo e não encontrarei nenhuma que preste, virão. Me reconhecendo no grupo a que todos nós pertencemos daqueles que mal prestam atenção quando o certeiro lhe passa; e sentem falta depois, de mãos (ou corpo) vazio. Nu.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Homem quando quer


A questão é tão simples que a gente finge complicar, para dar mais emoção. No fundo, sabemos realmente as verdades nuas, cruas e cruéis que fazemos questão de deixar passar, despercebidas. Despejamos as mais chatas das perguntas de se o cara tá afim ou não, analisando minuciosamente comportamentos e atitudes, falas e movimentos, com as amigas mais próximas (coitadas) e mentimos para nós mesmas tão bem, que quase nos enganamos - mas mulher sabe, e quando comete o delito de se transformar na louca carente desenfreada, sente na espinha a corrosão do erro cometido, do desacerto na ponta da língua, ao procurar quando não devia. Sem esquecer do jogo; e da comemoração, só feita quando os acréscimos terminaram e o abraço corrido já se deu por ocorrido. Vitória, para ambos.
Até então, na escalação, dois times: os caras que estão afim, e os que não. No primeiro time, estão aqueles que podem ir até o babão que corre atrás de você desde a infância, ao cara que você também tá afim, mas dá aquele tempo, disfarça e se segura. Enquanto ele não some por mais de três dias - é a regra universal, todos conhecemos - quer saber mais sobre a sua vida, ao invés do seu rebolado e te leva para jantar, aonde quer que seja. Apenas os bons moços, desse lado da rivalidade. Bons moços, e caras espertos (no ótimo sentido, pra todo efeito e nesses casos). Jogam aqui os que combinam com horários certos, procuram você sem ser insistentes (porque se forem em excesso, merecem ser ignorados para compreender com êxito o real sentido da sua negativa), convidam para programas legais e sentem o maior orgulho em estar ao seu lado. E a valorizam. Fazem dias comuns se tornarem inesquecíveis. Ligam mesmo após um dia cansativo, porque simplesmente gostam de você. E mesmo sutis, são perceptíveis. Surpreendem com pequenos atos, mesmo sendo caladões. Se tímidos, com você, fluentes. E raros, com o tempo fazem você perceber cada vez mais, o quanto valem a pena. Sem pressa, mas com atitudes - sim, eles tem - precisas, tem a sede de vitória que só você mata. Na maioria das vezes, se sagram campeões.
Do outro lado do campo, o time oposto. Bad boys, e cafajestes. Imaturos, inexperientes, ou aprendizes que não sobem nunca de nível - embora tentem. Lembra daquele cara que te fazia esperar sentada, maquiada e bonitona, pra nem aparecer? Ou aquele outro que mentia e inventava desculpas, tinha uma em cada canto da cidade e horror a compromisso? Então, também é veterano nessa equipe de derrotados. Moços que não ligam quando devem, e reaparecem apenas quando bem entendem. Telefonemas que não chegam. Relacionamentos instantâneos, fugazes e incertos. Intenções talvez nem más, contudo: inexistentes. Vão no banheiro e opa, quando você vai, passa por ele no caminho, debruçado no pescoço alheio (feminino). Mil promessas de amor não cumpridas, voltas e reviravoltas, egos imensos. Querer quando convém. Medo de qualquer intimidade que apareça com o tempo, ou intensidade sua, que escape num dos choros e guerras, cessar-fogos e bandeiras brancas por esses caminhos tortuosos e indesejáveis. Entram em campo com estigma de campeões em pé, e são derrubados no menor piscar de olhos: na corrida da vida que é esses relacionamentos que se entrelaçam e são sorte e azar, se confundem entre momento ideal, pessoas corretas ou não e afinidades em comum. Fatores decisivos, todos.
De fora de qualquer sentimentalidade, tenho acompanhado e visto mulheres cair na dúvida do que, de tão simples, complicam pelo prazer de também transgredir. Toda essa cegueira da qual tenho nojo e pavor, tamanha a simplicidade dos fatos que rodeiam. Chega a doer assistir ao desvario de companheiras de copo e de noitadas, faculdade e salão de beleza, esquecidas do que é necessário para não se deixar engolir ou enlouquecer por essas partidas por vezes enganadoras, quase nunca bem apostadas. Se ele estiver afim, será nítido. Transparente. Nem mesmo os nãos ditos no caminho serão capazes de fazer com que pare de correr. Homem quando quer, atravessa cidades e vai até o impossível. Encontra você, da maneira que achar, porque de tanto que deseja, vai atrás sem nem pensar em prejuízos e prerrogativas. Quer mais é correr atrás do que caça, e travar luta com os dragões no caminho. Empunha espadas, e a salva da torre maldita que é ser mulher e assistir a isso tudo, podendo muito pouco modificar um destino. Que resulta nisso aí mesmo: homem gosta de conquistar, é da natureza masculina.
Desde cedo, lhes foi doutrinado o papel de ir atrás e disputar, dominar e vencer; militar arduamente para se alcançar o objetivo a atingir, ver cada gota de suor no formato de recompensa. Depois de tantos dribles e percalços, tapas na cara, faltas e impedimentos, vamos logo nós femininas,  e de salto alto marcar o almejado gol? Não é justo, não nos cabe. Torcer, sim. De forma sucinta e silenciosa, para exprimir a felicidade e não deixar que a inveja corrompa. Agora, se ele quiser, e você também, os saiba que os adversários ficam para trás e são vencidos. Sejam eles o time do lado de lá, as paralisações necessárias, a prorrogação ou os pênaltis. Quando dois querem, unidos ganham o mundo.

segunda-feira, 14 de março de 2011

O problemático



Você tentou provar por x + y que o resultado não seria você. Não foi. Tentou equacionar o padastro com quem ele não se relaciona bem, as drogas que usa para esquecer o mundo, ou ainda, o relacionamento de três anos que derrubou com toda a auto-estima do coitado. Por fim, descobriu que o problema não estava nos seus pés grandes demais, ou no estilo de vocês, tão incongruente um ao outro. O problema é igual a ele, e ele se encontra dentro do conjunto de fatores que engloba a questão: há sempre um problemático que tranca nossos dias para que depois dele, nos tornemos experts na raça de Marte.
E nós, mulheres, nos descabelando com física, química e matemática. Ainda fosse. Pena que esquecemos que, como fêmeas, deixamos sempre ligadas as anteninhas da solidariedade, prontas para nos revelar um mártir à altura do radar. E com todo nosso cuidado, psicologia, colo, paciência e mimos, lá vamos nós em mais essa aventura de resgate másculo.
Tudo era perfeito. Ele lindo, você apaixonada. Até o dia em que começam os sumiços repentinos, desculpas pela metades, atos estranhos ou impensados. E puxa, o que será que aconteceu? Ah, é o avô dele que está no hospital. E nossa, o pai foi demitido. Ou ele se sente um merda no trabalho, por não conseguir ser promovido nunca. Quem sabe, entrou no mundo das drogas e agora não vê saída de largar o vício vivo. Pode simplesmente não saber o que quer da vida, e estar confuso quanto ao seu mundinho quadrado. A verdade é que, aos poucos, ele se torna tanto o problema, que esquece de ser ele mesmo. Se não pode ir ao jantar da sua família, sabe como é, estava deprimido. Ia a uma entrevista para outro emprego. Estava com os amigos que bonzinhos que o levam direto para o bom caminho. E sabe como é, você tem que dar apoio. Entender, e não criticar. Ele, que adorava beijar você por horas intermináveis e ver um filme atrás do outro, agora só a procura para despejar o que o aflige. De namorada, você quase passa a ser terapeuta. Ou de ficante, o relacionamento nem evoluir consegue.
Isso, com certeza começa a fomentar a infelicidade aí dentro, e deixar pegadas de se o erro é você, que se meteu na vida do moço justamente na hora errada, ou se o impasse é que é enorme demais para ser combatido conjuntamente. Você, cada vez mais tentando ajudar, e compreender, quase vestindo as botas vermelhas da Mulher Maravilha para que tudo passe logo e volte a ser como aqueles dias, no bom princípio que o destino reservava para os pombinhos, e se perdeu nas velhas folhas do calendário. Ainda assim, nada resolvido. Proporcionalmente, a distância daquela divindade que pensava ter encontrado no começo, aumentada: lá trás, no formato de lembrança. O rapaz fingindo não ver o que com ele acontece, e apenas o próprio, pode solucionar. Vendando os olhos e esperando que tempos melhores cheguem de uma vez. Projetando em quem nada a ver tem, o que nele deveria refletir e ressonar. Porque mesmo que nas costas, cruzes enormes sejam carregadas, quando ao lado alguém que realmente nos faz sorrir estiver, os lábios não exitarão em deixar os dentes à mostra. E tudo, que era então dificultado, se tornaria mais fácil, quase indolor. Facilitado. Seus recursos e salvações todos em vão, e o abismo entre os dois cavado cada vez com maior profundidade. Para quem realmente quer, os problemas se tornam coadjuvantes. Ou na verdade, nem existem.
Saldo final: culpa, ressentimento, dúvidas. Sendo que, tirada a prova real, tudo certinho: não houve erro, da sua parte. Já da dele, negligência; desatenção. Perder uma mulher assim tão poderosa, heroína e corajosa, não é para os fracos: e sim, os covardes de enfrentar essa vida com olhos abertos e coração valente.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Pero sin perder la ternura jamás




No meu período pós-revolucionário, uma porção de efeitos e consequencias. Minha subversão interna, aparentemente, catastrófica; em contrapartida, necessária. Houve lágrimas e uma dor aflitiva. Rotas traçadas que desembocaram em caminhos impensados. Ataques impróprios, traições nunca antes sequer cogitadas. Em guerra, por tempos de paz. Pela liberdade do espírito; em prol da chama acessa, porém plácida: viva, sem peitos feridos e incêndios verbais. Flamejante. Após o tempo de descanso necessário, de pé e pronta para outras: me tornei uma guerrilheira do bem próprio, sem nem ao menos notar.
E sim, enrijecida. Da ótica positiva, mais forte, até mesmo curada. Olhar atento aos relacionamentos ao redor, feito órbitas de um Saturno que é individualista e vê apenas o seu centro exato, intenções e quereres mais íntimos. A sensação de nunca mais conseguir ser tão frívola e imaginativa, de uma felicidade tão tola que inquietasse a vida alheia. Sem o sentimento aéreo de crer no desacreditável, e ter fé naquilo que não vingaria nem mesmo com terços rezados e bençãos dominicais. Hoje, estática. Firme em minhas convicções, descrente total do que realmente representa o amor, e este pode representar. Nunca mais ter a base estremecida e os tremeliques sutis de se sentir viva não porque dá pinote o coração, mas sim, porque o órgão funciona além de apenas bombear sangue para o corpo todo. Abandonar a fantasia de cair em beijos quentes e arroubos de paixão repentinos. O amor deixou de me comover, para me dar náuseas: regurgito palavrinhas e pensamentos internos tão racionais e céticos que quase me sinto matemática. Farejo no ar a hipocrisia de casais de fachada fake, que brigam quase diariamente, e à noite fazem as pazes, no calor da hora - just for sex. Descreio namoros, analiso friamente ditos e ações, assisto possibilidades que quem ao lado anda, parece não enxergar com alta resolução: é triste, mas gira o mundo por dinheiro, sexo e por último, amor. O mais nobre dos sentimentos, banalizado por tantos que querem e pensam sentir o que nunca até então lhes ocorreu. E lá vão estes falar "eu te amo" antes da hora. Firmar compromisso sem nem ao menos em tal estágio se encontra. Enquanto várias das moças que observo acham um amor, muito bonitinho, que fofo, penso calada em como consegui assim viver por tanto tempo. Nas falseações de tanta coisa que não existiu, e fantasiei, ansiosa por bancar a princesa Disney e distraída, não notar que vestidos bufantes e saltos de cristal não cabem e nem se acomodam na realidade da mulher moderna. O olhar treinado e a percepção ampla do que poderia facilmente vencer essa barreira que impus, abstraída, e daquilo que nem em trocentas tentativas me tocaria de maneira brusca ou até mesmo intensa para que abalado fosse esse estigma sólido de sentir que construí. Difícil encontrar nas imaginações de futuro este protótipo de mim que foge dos tentáculos de afetos e apreciações quaisquer, tão pueris era eu antes dessa última queda. Quando foi que queimei os livros de auto-ajuda aqui de casa, e comecei a redigir minha própria história com final etéreo, e no caminho e com continuidade, feliz? Faz parte da trajetória, eu sei. Deixar que nos atinjam em cheio para que quando o tornado retornar, fortalecida esteja o refúgio, nossa defesa: a alma.
Endurecida, então. Sem perder a habitual ternura de tilintar cílios e absorver com os olhos. Com uma pitada do humor ácido na ponta da língua e sorriso de quem sabe do mundo, e não conta. A mesma doçura de sempre, porém com toques, rotinas e pessoas programadas, à dedo selecionadas. Porque há que ser brava, e simultaneamente, branda. Fundir sensibilidade com coragem e pulso.Saber a hora exata de sumir, silenciar e agir, sem pestanejar. Sem perder a ternura, jamais.

Estimação



Quem é essa que chora com cena de novela, e se pega rindo, irônica e erroneamente, quando a briga é séria? A moça que não vive sobrevive sem doce após o almoço, e se uma soneca no meio da tarde tirar, muda o humor como quem vasculha o próprio armário: à procura do espírito que sirva e agrade. Experimenta. Troca. Aprova, mesmo sabendo ser pouca a duração da escolha. Não fosse por um olhar mais atento, quase não reconheceria.
A dita que no cheiro das livrarias sente o consumo coçar-lhe a mão, o cartão querendo asas na carteira. Horas gastas, obras de perto apreciadas, frustração sem sacolas e mãos que abanam, vazias. E então: sapatos. Coloridos, altos, femininos. Como num passe de mágica, a volta estonteante do desejo de comprar instantâneo, brusco. Experimenta um, quer dois. Poderia comprar quatro no cartão. Senta. Reflete, viaja, conspira. Decide: o preto não, já tem três. O rosa aperta o joanete, a praga e herança bailarina. O azul é diferente. Sai da loja de sacola esvoaçada e o mundo carregado naquela caixa de papelão: a alavanca eficaz pra qualquer auto-estima feminina. O salto, onramental ou simplesmente doze, que deixa a visão mundana amplificada, gostosa de admirar.
É a mesma donzela que chega em casa, e cozinha. Reencarna a Ana Maria Braga distinta que há meses nela se perdeu. Sal de menos, açúcar demais e: nada de paixão. Vai de biquíni pro sol escaldante lá fora, morena, cabelos negros, efusivo; todo seu. Em plena civilização, o ritmo do dia correndo às pampas, e o corpo estacionado em direção ao princípio da existência, à estrela maior. Música nos ouvidos, olhos reclusos, quase sono. Redescobre astros e constelações no céu azulado, esquece as cortinas abertas e se manda pro banho de horas. Se desdobra para não dar show aos vizinhos, de toalha no corpo e cabeça. Finge a surdez quando chamada, troveja a voz, quando a urgência se apresenta. Dama paradoxal, quer os leões do sacrifício diário todos vivos: seus percalços são como bichanos de estimação. Zelo comum: recíproco. Alimento e carinho em troca de resguardo. Para que a cuidem quando a vida quiser a engolir, para que a protejam, vociferando os percalços do caminho, um a um. Cansada de ser várias sem agrado e aplausos exaustivos, quer ser apenas essa uma que dê certo, que ganhe o papel no fim do teste. Dentro do que é, tantas. Em cada uma delas, a mesma, na versão atualizada do que o momento pede, a hora necessita. O encontro da parte sensível, com a brava. A mistura de ser impulso com precaução, instinto e admiração. Deixar que a louca se vá, para que venha a santa, benévola. É quando o tempo esquenta que chove inteirinho aqui por dentro. Na fuga da ansiosa, se deparar com a compulsiva. No rito interminável de me redescobrir, é que aos poucos me fragmento. É no meu sono que começam meus sonhos; e ao vivo, que encontro determinação para realizá-los. Definir não limita, impossibilita. Aborta espontaneidades e futuras surpresas. Que é quase outono, e não há porque sacrificar os desafios do caminho: nesses que verdadeiramente nos encontramos, pelas beiradas. Os leões tem de ser cuidados e acariciados, com cuidado e parcimônia. Que é quase outono, e o abrigo é necessário: o pior frio é o que congela a alma e impede movimentos.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Um breve comunicado.

Sei que muitas pessoas vem acompanhando o blog, e gostaria apenas de esclarecer algumas coisinhas. Bem, os textos aqui postados são TODOS de autoria minha. Tive algumas ótimas fontes de inspiração, que se soma aos anos e anos das mais variadas leituras, tomando gosto indiscutível pela introspectiva.
Antes de criar meu perfil para moderação, já tinha este blog. Poderia ter outro nome, e era sim anônimo, porém eu o encarava apenas uma válvula de escape para os meus sentimentalismos mais mundanos e desabafos, numa tentativa de permanecer lucida e em paz. Peço que relevem também os erros de português. Eu escrevo com bastante pressa, porque meu pensamento é rápido, muitas vezes até, tenho duas, três idéias simultâneas, e só vou digitando digitando digitando. Sim, o teclado já está bastante debilitado devido à minha força e intrepidez. Agradeço à força positiva que muitos vêm me dando, aos elogios, desejos de sucesso, de paz e todas as coisas boas que me estão sendo proferidas. O meu mais sincero obrigada, de coração. São pessoas assim, que ainda deixam o coração se manifestar, que ainda choram, ou se tocam com textos demasiado emocionais, que me fazem continuar em frente.
Um último ponto a ser esclarecido: dos meus textos e poesias, poucos seguem alguma linha cronológica. As poesias, muitas vezes não refletem o que eu sinto, mas amigas próximas, ou mesmo pessoas que você capta a aura, a essência. Embora, os textos são todos os meus sentimentos, sim. Os rapazes a que me refiro, não são sempre os mesmos. Digo certamente que aí, nesses quase um ano e meio que já venho escrevendo no blog, tenho aproximadamente cinco homens a que me desprendi de tempo e vontade para falar algo. Fora alguns outros perdidos e que escrevi apenas uma vez sobre, e apenas transcrevi aqui textos de um caderno em que eu escrevia à mão.
É isso. Mais uma vez, o meu muito obrigado. Sei que muitas pessoas ficam receosas em comentar aqui, e me deixam recados, ou mesmo depoimentos secretos com adjetivos maravilhosos, mas não se acanhem...Por mais temperamental que eu possa ter soado, não mordo.

Medrosa.



Hoje vou contar um segredo: sou uma medrosa. A maior de todas - que conheço. Dessas que ficam feito menininha com medo de trovão, escondida debaixo do lençol no quarto, das barbáries do mundo. Tão corajosa para o que julgam alguns o impossível, o dificílimo: amar sem medo e questão de retribuição. Mal sabem que é nas mas ínfimas atitudes que me escondo de mim mesma, desse mistério que só relevo quando chegam as respostas. As quais em grande parte das vezes - avisada pela intuição - já sabia. Ou na verdade, a revelação surpreendente do que até então, fingia ser anônimo: o que existe e por pura tolice, ignoramos.
Os resultados são os maiorais, dentre minhas fobias. Reis em minhas preocupações. Todas, em si. Importante, cada uma delas. Se não me fossem, resultados não seriam, e sim: apenas consequências. Então, se envio, é bem possível que adie a vista da réplica. Se falo, posso fingir-me de surda, caso não queira escutar. Jamais deixo de lado uma ação pioneira que seja, porém, nos encantos de cada conquista, me protejo tanto que me assombro. Um temor de se perder o que ainda nem se tem. O alheio nunca conosco é o que seríamos nós mesmos, no caso oposto. Em situações adversas, adversárias.
Posso ser eu esse paradoxo reacionário que com o maior atrevimento ama, e se joga, se entrega sem pedir de volta, e simultaneamente, nas atitudes, pelas beiradas vou e como dama chinesa, branda e compassiva, ajo? O receio gritante da temida palavra, em contraponto à vontade maior de se arriscar e ir indo pelo caminho que muda a rota com frequencia, esse meio-termo a que detesto e ensaio sempre alguma transgressão à altura. Seria intuição, esse ato comedido e de revides tão vibrantes no sexto-sentido que adio sempre? É impulso o ato de agir, e se amedontrar com qualquer reação de outrem? Não. É confiança. Em mim mesma, na verdade que de mim sei, e por mim, sai. Não sinto medo da humanidade, é em pequenos atos que se esconde minha coragem. No caminho até ser construído e fortalecido um sentimento, qualquer derrapagem e uma história se cambia, muda todinha. Ímpetos de ação, intercalados a períodos de reclusão própria, benfeitora. Esse medo da cota negativa que apresenta a vida, ocasionalmente. Aprender, preciso. Saber que é de alguns nãos, que a vida nos encaminha para que o caminho do sim se aproxime. Deixar que ser destemida seja uma característica presente, e não bipolar. Que mesmo ferida, a fera que habita aqui seja indômita e decidida, mais forte que qualquer recusa, ou negação. Porque pela cota diária que calculo, para balancear e deixar cada dia leve e único, quando vai tudo bem demais, é necessário um choque para que nos mantemos vivos e alertas: agitar a alma é o que capta momentos e ações, o viço de novidade sempre em dia. Sem chance pro medo, que se não ele consome até mesmo os mais enfadonhos sonhos; os indescobertos.

Sem caio, rosas.


As homenagens são tantas, e fico aqui em branco, sentada, pensando exatamente em como começar. Existe isso de não haver conhecimento algum, nenhum toque ou olhar, nenhum autógrafo em primeira página, e ainda assim, sentir por inteiro o que em anos passados sentiu? Acredito que sim: pela memória eternizada em livros e escritos, vídeos e fotografias. No patamar de sílabas e emoções, experiência e palco da vida, Caio foi rei. Em externar sentimentos como quem desata todos os nós internos: da delicadeza que ocasionalmente acometia as palavras de Caio, do peito inserido por entre vírgulas e predicados, da força brutal de seus escritos nesse cotidiano já tão defasado de banalidades. Há uma quinzena de anos, Caio se ia. Num piscar de olhos, se foi. Eu, talvez, com meus sete anos, pedisse a chupeta que esquecia em casa quase sempre, já no carro. Ou eu criança precoce, treinando a fala e correndo com as perninhas curtas e grossas pelo mundo à fora que nem sabia ser tão grande, mas que é enorme. Ainda assim, Vitória, um ovo de cidade. Quase ervilha. Cidade grande com ar interiorano. Tão longe da cidade, dos gaúchos.
Três anos atrás, a descoberta dessa literatura que nos engole pra dentro, de Caio. Vício imediato. Paixão pelo mistério de em outras épocas, anos antes, alguém sentir o mesmo e colocar para fora da forma mais angelical que encontrou: sublime. Do jeito único de se reencontrar, que era escrever, e encontrar mais uma multidão de admiradores que são sensíveis e nas linhas captam a magia de apanhar todos os pedaços e seguir na vida, inteiriços do feitiço do mago Caio. Queria ter como sorte poder visitar o Menino Deus, e sentir no balanço de cada uma dessas árvores que assistem, um rastro da sedução lustrosa que pelo caminho, o rei eterno da introspecção deixou. Nas ruas do Centro, onde habitou e transitou diurnamente, em cada esquina, um resquício do que pode ele ter contemplado. Uma visão que pode ter inspirado o glorificado monarca da minha (e de tantas) prateleiras, soberano. Amigo íntimo a que não viemos, a maioria, conhecer. Sem apertos de mão, sem nem mesmo a ultrajante cabeça pensante em seus debates filosóficos, suas entrevistas polêmicas, para observar como agora anda esse mundo que vivemos. Igual: o conselheiro a que tantos nos reconhecemos, um ícone.
Hoje, em homenagem a este que tanto admiro, e nem mesmo posso contatar (telepatia, talvez? Profundos pensamentos, para que cheguem talvez ao céu ou ao paraíso, onde com certeza se encontra Caio) tentarei um dia, como em seu aniversário, um dia de paz interna. De chá no meio da tarde, jazz e blues ao pé do ouvido. Cometer uma loucura, pequena que seja, para sentir a vivacidade no sangue. Nomear objetos, pegar um avião e sumir por aí. Entrar dentro de cada um desses personagens que por nós passam, e a sensibilidade despercebemos; o fino traço do rosto, a exatidão dos gestos. Desvendar pessoas. Declarar paixões. E rosas. Como em seu aniversário, uma visita com direito às mais vivas e robustas rosas que encontrar no caminho. Bem cultivadas, duradouras, para colocar ao lado da foto em preto e branco. Tudo pela genialidade desse Caio que nos atinge em cheio, e quase nos pega no colo, em cada reflexão perspicaz. Inspira e traduz almas e afeições. Tenho certeza que Deus já o tem lá em cima, junto aos anjos e a um céu tão azul que o faz o mais feliz dos querubins. Desses que assistem e enviam axé, força e fé a todos nós que sentimos demais e com complexa atenção os dias, na ponta dos dedos. Viva Caio, que deixa cada dia nosso mais doce.

Reflexo.




Te vejo, e me olho. Te toco e me sinto. Se assisto teu erro, a vontade é de acertar, para que tudo equilibre; equalize. Quando dormes, sou eu quem sonha em profundo estado de êxtase. Ao te ter ao lado, realização. Quando longe, uma ausência presente, porém amansada, quase quieta. Tu, que és o eco perfeito do meu peito que insiste em gritar - quase loucura, possível felicidade, pequena angústia. Bom que não somos imitação: e sim, complementação. Suprimento daquilo que no mundo nos falta, e reencontramos a cada abraço ofegante, desesperado. Reflexo de toda a sua luz dourada de gente, polindo meu brilho indireto de lua e desejo de se esconder, toda noite. É tocando em teus cabelos que me eriço, quando roças os pés nos meus, meu corpo é isto que se acalma; tão quente está o coração. Vestida de ti é que trajo a tão desejada paz que busquei em vão, em beijos alheios, expectativas incompletas, relacionamentos relâmpagos. Bom saber que se quiser assistir as estrelas, em silêncio, é no espelho dos teus olhos, grudados aos meus. Capto no ar sua respiração propagada, para por osmose deixar que a nobreza desses seus atos principescos me atinja, em cheio. Nas marcas de batom que em tua nuca deixo, evidencio a propriedade acerca de todo teu sentimento: meu.
Nessa minha telepatia mediúnica tão habilidosamente treinada, é que te reaproximo, mesmo sem querer; continuamente. Na superfície lisa que é toda essa linha disforme de nossos encontros perfeitos, onde quero mergulhar. Faço de cada pequeno arranhão ou impureza algo a em mim aprimorar. Para que te passe, que em ti vislumbre, e por fim, sare. Ignoro possíveis molduras e rótulos, em prol do brilho de refletidos um no outro, nos reconhecermos cada vez mais como par.
Do seu lado, irradio palpitações de alegria, enquanto vejo no seu reflexo a vontade enorme, gritante e de certa forma, atrapalhada, de ali estar. Sem toque, vozes mudas, instantes de intimidade tão profunda que, ao ficar calada, não se importa: se normaliza. A arte de desenrolar o novelo dos seus problemas, e acabar no final das contas, diluindo os meus. Até mesmo esse silêncio de sábio que ostentas, tem em minha esfera particular reação: falante que sou, desando a palavras usar, até que me cales com qualquer ato ou frase perfeita, na hora certa.Rabiscos por entre as páginas de cadernos e agendas, orelhas de livros dobrados meu nome junto ao seu, feito tatuagem; eternizado. Combinado.
Como ficamos bem, aliás, um sobre o outro, compostos, harmonizados. De dar vontade de observar o dia inteiro, ensaiar caretas e gestos, posses e espontaneidades. Dois semelhantes semeando o que um no outro falta, e no mesmo, se encontra: a possível perfeição de um encontro eterno. Sem desgastes, sem longas esperas, embebido em renovação. Espelhados pelo retrovisor desse caminho que até aqui cursamos, e pela frente podemos avistar: aberto, livre. Pelas vitrinas da cidade, minha mão na sua, duas metades findadas. Únicas. Realizadas.

Venusiana



Há em mim um lado tão humano, que necessita doação: é caótico, transgressor. Quer de mim partir, porque deste ser e coração tudo já sabe, do íntimo é cúmplice. Com a precisão dos sábios, espera e fatidicamente, age. Em busca do encanto primário, do toque de olhos que de tão necessário, faísca. Abnego o eco das tantas frases que digo, apenas para que, em segurança, escutes. Desbaratino em tanto querer prover, nos ínfimos detalhes para cuidar da perfeição de um momento, uma ligação, que aos poucos entrego ouro e pedras raras, moedas e significâncias. E é nessa entrega, que me devolvo o prazer de estar viva e sentir o peito quente, o sangue pulsante. É quando me torno complacente e cordata, passível de ser contornada e por fim, dobrada; é no amor completo que me sinto em casa, de chinelo nos pés e camisetão. Inteiramente em paz.
De tanta dedicação, me pergunto: como há tanto ainda também, por se esvair e libertar? Da fraqueza feita força, talvez. Nos restos de tanto escrúpulo e mala gente, o doce desejo do amor romântico real, absoluto. Bem vivido, apreciado: crescente. Da benevolência que insiste existir, a ardência de se ver em cada casal de filme, de arder em cada momento de paixão. A coragem de desbravar por inteiro um interno mundo até então, misterioso. Projetar o inexistente, idealizar o que de maneira mais simples, ao meu querer se adeque.
Não que seja simples, todo o encanto, a tal sedução que ensaio: é raro. De uma delicadeza de pôr no colo e embalar canções. Porém, escorregadia: se escassa de sonhos, e chamegos de manhã, cortejos e alas abertas, me escondo, me fecho: mutável, calada. E de santa, passo a ser fada delicada que o mundo sobrevoa. De fada, flor que beija: pássaro que pelos campos se distribui e nisso vê sua felicidade concreta.
Fecho as janelas, e logo as venezianas. Já foi longe a imaginação, e o chão a ser percorrido, é agora o do sono. Uma noite em Veneza, talvez. Baile de máscaras, passeio de gôndola, um beijo lírico em cima da ponte: pelas emoções que desaguam, límpidas. Em meu Romeu.

O gato, não gato.



Enquanto ele passa, pacato e sem pressa de viver, olhares cúmplices e segregados são trocados entre elas. Ele vai caminhar como quem dá passos largos e triunfantes por algum tapete vermelho que nem ao menos sabe existir, e rei que é e desconhece, aparece a coroa imaginária apenas na vista de quem o vê assim, soberano em impregnar sua digna existência de ser-humano comum, mas que embeleza todo santo dia os olhos das moças que o observam; ainda que tímidas, ou à espreita. Mesmo com aquela camiseta meio desbotada, sapatênis, ou até mesmo regata é essa beleza quase exótica que marca, e que nem mesmo essas doidas compreendem, que elas o acham irresistível. O mais gato da rua, da faculdade, da academia, do trabalho. O bonitão do pedaço. O capitão do navio de sereias incansáveis. De saciar em silêncio esse seu charme de gentleman inglês, e ao mesmo tempo, em algum outro dia, qualquer ação mais rude de fanfarrão extraordinário. Enquanto ele escreve, donzelas sonham que com tais palavras alguma carta sentimental às salvem os dias. E quando ele sorri, até mesmo as pequenas garotinhas pensam em off, com sua voz em narração interna: foi pra mim. Tudo porque quase todas as mulheres presentes o acham super lindo, o muso de tantas e tantas inspirações, e nem ele mesmo sabe disso. Quantas e quantas o admiram em confidência, e mesmo sendo fêmeas, travam a língua. Ele é o último a saber, e dessa vez, nem corno é. Ainda que ele não possua carro e nem muito dinheiro, e tente ganhar a vida exercendo papéis medíocres que aparecem por aí, pelos grupos e círculos sociais, é sempre lembrado como a formosura em forma de ser. Em todas as vezes.
Moçoilas empenham feitiços para acabar com seus relacionamentos, e repetem que aquela é uma baranga, e a outra ainda é uma biscate, tudo porque a guerra sigilosa entre quem algum dia terá qualquer remota chance com tal príncipe que não é loiro, e nem tem olhos azuis, é de altura mediana e veste roupas totalmente básicas pode mesmo ser mágico ou mago mesmo, já que o truque da hipnose deu certo nesse caso - e em mais de dez das duas amigas, pelo menos.
Isso tudo porque ele não deseja ser rotulado como bonito, e quer ser inteligente, e assim acaba tornando ainda mais voraz o apetite de quem o quer por perto, simplesmente porque ele não se preocupa com nada, muito menos com o que pensarão os outros, e brinca assim com o cachorro de rua que aparece, sendo além de magnífico e inteligível, caridoso e solidário. Irresistível. E assim nos faz questionar, qual o defeito desse cidadão que de alguns ângulos nem é assim tão bonito, mas que com toda a despreocupação do mundo coloca pra escanteio todos aqueles que se embelezam e com isso se preocupam - em vão. Suas amigas e você questionam que ele deve então dirigir mal, ou ter voz fina, não praticar esportes, usar o perfume errado. Ou quem sabe cueca colorida, ou na verdade, nem usar nenhuma. Continuando sem descobrir aonde ele peca em ser tão deus e ao mesmo tempo, desejar como nunca se tornar reles plebeu. Algum erro há de ter, alguma equivocação em tanta coisa boa, que na verdade é absolutamente normal, e por algum motivo ainda não desvendando pulsa em meio à massa. Mulher adora se preocupar, e adora mais ainda alguém que não se preocupe com nada. Muito menos com ela, e sua vivência montada em make-up, cabelo e roupas novas. Eis o segredo do moço: exibir seu borogodó por aí, e não olhar para os lados, sem se importar com possíveis fã-clubes, ou clãs de adoração. O que aumenta ainda mais seu charme em potencial, e a paixonite aguda que brilha aos olhos das donas que vêem. Secreta, até que se prove o contrário. Porque ser low profile também é afrodisíaco.

quinta-feira, 3 de março de 2011

O louco por você.


Ele estava ali, sempre. Se olhar mais atentamente, ainda deve estar. Escondido, por trás de alguma árvore antiga e de raíz espessa, observando o momento fatídico, em que você, invariavelmente, vai estar sem companhia alguma; solitária. Para este ser, apenas poder olhar você, já um grande feito. Ele assistiu à sua queda vertiginosa, no momento culminante em que você sorria com os olhos fechados, e gritava qualquer verso de uma canção batida, bem alto. Feliz. E de repente, ao chão. Viu sua ascensão, e também a presenciou rastejante, sem forças para levantar. Cavalheiro que é, até a ajudou. Ofereceu colo, seu paletó, afeto e qualquer outro mimo que a fizesse sentir menos deprimida e blasé, tudo porque ele realmente detesta a ver com os olhos lacrimejando e aquele semblante de menina ingênua que deveria estar feliz, e não está. O moço é bom, você pensa. Tem um coração de ouro. E então numa abertura encoberta de fraqueza da sua parte, ele aproveita. Começa a demonstrar amor até onde nem você, romântica e inventiva, imaginava que pudesse existir. As mensagens inesperadas no meio da tarde começam a aparecer, juntamente com algumas ligações para contar que almoçou massa carbonara, que você adora, e que viu aquele filme, que você recomendou. Sua palavra passa a ser quase uma ordem: você disse que adorava homens sarados, e lá está ele, matriculado e suado, na academia do bairro. Quando cita que ama morangos, ele chega com uma bandeja cheinha deles, e nem mesmo é época da fruta. Ele a acha inteligentíssima, e jamais discorda ou contrapõe suas opiniões - longe do subalterno bater boca com a abelha-rainha, não é verdade? Se pudesse, ele sairia por aí com uma camiseta, estampando você e com o honroso escrito logo embaixo "Fã número 1". Só falta segui-la na rua, ou vasculhar a sua vida na internet (se é que o maluco já não o fez).
No começo, é ótimo alguém que eleve o ego lá em cima, e a faça sentir gostosa e desejada, mesmo de pijama, coque, ou calça sarouel. Porém, como no caso dele tudo são flores e melação, e você é uma diva exótica e digna de tanto apreço, você enjooa. Vai deixando pistas sutis de que pra você, ele apenas foi uma ótima distração, que ele é uma pessoa maravilhosa, MAS agora não. Você curou seu coração com a distração que o rapaz proporcionou, enquanto para ele, toda essa admiração imensurável parece estar aquém de possíveis profilaxias. E o celular fica cada vez mais desligado, os recados e convites pairam no ar, enquanto ele não compreende como você pode deixar pairando por aí alguém que a admira tanto e acha a mais sexy dentre as mulheres da cidade. Alguém que pegaria o carro e a levaria para a praia, para o farol que você acha lindo, para ver as estrelas em cima do morro enrolada num cobertor. Alguém que a daria não só aquele brinco, como aquela blusa, aquele salto quinze, amor, carinho, cumplicidade e o mundo se possível. Que quer a apresentar para a tia que mora longe, para o avô que adora morenas e para a babá, que o criou desde pequenininho. Que quando você disse que adorava Belchior, cantou no violão, e quando comentou que estava lendo poesia, lhe dedicou um poema, num jantar entre amigos. Por fim, o trem que realmente deixou a desejar: que esqueceu de se colocar em primeiro lugar, e que acaba aceitando você mesmo ferida pelo machão que a dispensou com desculpas esfarrapadas. Que faz de você a razão da sua existência, e que às vezes, até de dá um certo medo - a cota de pessoas psicopatas aumenta significativamente, a cada dia.
Esse homem, com uma personalidade escassa, e tão pouca altivez, ainda assim, é um cara de se respeitar. Afinal, ser louco por alguém, e fingir cometer suicídio quando você diz que vai dar uma voltinha, sumir pra sempre e ser feliz, é tarefa para raros. O grande problema é que, o que em você estava regenerando, nele está em falta: amor próprio. Quem sabe quando alguma garota igualmente maluca por ele cruzar o caminho, ele reencontre sua hombridade viril, e sinta na pele o quanto pode ser devastador beijar os pés de quem não nos dá a mão na rua. Enquanto isso, ele segue sendo o divertimento cabível que você encontra, até achar algo melhor; condição que ele mesmo aceita, se dá e assina embaixo. Cada um escolhe o papel que vai ocupar tanto na sua própria vida, quanto na alheia. Cãozinho, endoidecido ou subalterno, ele continua louco por você

A piriguete


Ela vai tentar roubar as suas amigas, cativar o cara que você está ficando e toda e qualquer pessoa que cruzar tanto o seu caminho, quanto o dela. Você com certeza não fez a besteira de criar laço algum com um tipo barato desses, porém, da maneira que menos esperava, a vadia está na sua vida: a piriguete.
Não tem nada a ver com reputação, e falso moralismo. Mas sim, personalidade. Todos já erramos, já passamos da conta em algum momento, cometemos cagadas homéricas. A verdade é que, rotulada, ou não, vai bem além disso.
Ela não é sua amiga. No máximo, a aproximação que vocês tem é sair com amigas em comum. E olha que você evita o contato, eu sei. Faz de tudo para não expor a sua vida, não falar em demasia, e se manter longe. Ela parece simplesmente adorar estar perto, para provocar. A voz alta, mais um de seus trunfos para chamar atenção. Dá gritinhos estridentes e insuportáveis, abraços falsos e efusivos, e nem liga pro que o mundo pensa dela. Aliás, a única coisa que faz de correto na vida. Estudar? O sonho dessa rapariga é ser madame. Socialite. High society, rotina vazia e um homem rico ao lado. Amor, é para perdedores. Faz questão de salientar que está apenas pelo sexo casual, e só. Para conseguir o que almeja, passa por cima do que pintar pelo caminho. Poucos sabem que, quando não atinge sua meta, não acerta seu alvo, chora assim que bate a porta do carro, alto e péssimo som. Se debulha em lágrimas, e compressa o coração apertadinho, jurando que vai cair na sacanagem, e que a vida vai ser ainda melhor. Que a solução pro desamor que a deixou por uma moça célebre e conhecedora do mundo, culta, se encontra no fundo da garrafa de vodka que descerá na noite seguinte, amanhã. Todinha. A mesma habilidade que possui para enganar, seduzir, manter cinco caras em equilíbrio e na espreita, não é a mesma para conquistar sentimentos estáveis, duráveis. E claro, ela incompreende a sua felicidade quando apaixonada, e sua tristeza, de coração partido, tudo porque a superficialidade já veio embutida na vagabunda: é de nascença.
Como cantam, e reconheçamos: a piriguete não sente frio. Pode estar quase nevando, que lá está ela, de roupa curtinha e ju-ran-do que, tá tudo bem, tudo legal, e o frio? É psicológico. Melhor fingir que entende, a ouvir uma explicação cabulosa e esfarrapada sobre o look da garota. Roupas coladas, make pesado, e histeria, seus fiéis escudeiros. Sutileza, um desconhecimento. Exagera nos acessórios, extrapola o bom senso das combinações. É brega sem notar, pensa (será que pensa mesmo?) que arrasa, quando na realidade, chama atenção justo pelo contrário: pela desarmonia que sua figura caricata constrói. E piora, a cada dia.
Status, para ela, é luxo. Dinheiro na carteira, para a criatura, é lei. Inteligência, cultura e um bom papo, dispensáveis. Para a piriga, o corpo é a chave de tudo. Ou, bem, na verdade, a fechadura.
Acha chique bancar a má. Influência das novelas que assiste uma a uma, sem perder um só capítulo. Se a nova modinha entre as meninas de balada é beijar outras meninas na boca, lá está ela. Fuma por charme, não por gosto. Nem tragar o faz com sapiência daqueles que sorvem do cigarro tudo o que podem. Sem prazer algum, se para ser hype é preciso fazer uso de drogas, lá vai ela. A personalidade? No ralo, com todo o vômito de restos de comida, bebida e batom que exala, periodicamente. O que importa é sair e beber, e beijar quantos puder, quem vier. Mesmo sem grana, arranca a de quem estiver por perto. Bom mesmo é manter distância.

Nunca pela metade, por favor.



Eu queria ver o mar, agora que estou crescendo, porque sim, algo dentro de mim me faz sentir que eu venho amadurecendo mais ainda não perdi aquela criança mimada que mora em meu peito e o faz ter uma vontade incontrolável de morrer afogada em lágrimas de angustia em dias chuvosos.
Mais hoje, ah hoje não... eu a coloquei para dormir em um sono tranquilo e não farei barulho alguem em minha mente para que ela não acorde.
Hoje quem da as caras é a menina mulher, que usa calças justas alguma blusa mais decotada e se acha bonita, sorri docemente, se arruma para sair, ou simplesmente para ficar em casa enquanto canta hard rocks animados, alguns dizem que ela esta louca, maluca, pirou completamente, ela apenas diz que esta descansando.
Descansando? Sim, a mente, afinal todos precisam de um descanso, como fazia um bom tempo que não tinha um bom sono, a alegria servia para descansar sua mente, mais alegria do que afinal? talvez de ter sobrevivido mais um dia, agora Kiss tocava no radio cantando Do you love me? e vestindo uma camisa e chinelos de pano confortáveis ela sentava na cama fazendo caretas no espelho enquanto cantava "Do you love me, do you love me Do you love me, I mean like do you.Really love me ?"
Ela ria sozinha se achando a louca, ela tinha essa mania de nada pela metade, se estava triste era uma tristeza mórbida que cheirava a terra molhada e casa úmida e fria. Quando estava feliz o mundo parecia um episódio de Friends aonde ela ria pelas idiotices de piadas sem graça mais que faziam sentido sem fazer sentido algum.
Ela iria ter algumas conversas legais com amigos legais e esquecer qualquer coisa que fizesse se sentir mal, e se acontecesse de esbarrar por essas coisas no caminho, ela olharia com ironia e sorriria de tudo.
Pois como dizem, apenas sorria e acene meu bem :D

quarta-feira, 2 de março de 2011

Viver e deixar morrer.


Enterro aqui a ilusão de um romance fácil, avassalador, conturbado e apaixonante, que como praticamente todos de tal biotipo, não sobreviveram ao caos diário. Às vadias fáceis, à bonança festiva, aos zilhões de amigos opostos. Aos palpites desconfiados, ao momento - errado, fatídico. Contaminado com o azar do destino, afetado pelo cansaço de remar contra a maré dos afetos: sempre desfavorável, os ventos. É com pesar que nem lágrimas sinto rolar por isso que em mim já não mais vivia, e cética e dura, talvez fria, oro enquanto fecho eu mesma no quintal dos sonhos, mais esse caixão. A sensação é tal a de um luto que já havia ensaiado, meses antes. Sem cortejo fúnebre e nem convidados, apenas eu como espectadora daquilo que teci e planejei. Única visualizadora do feixe de imagens e sons, de arrepios e visões de um fatídico final chama ao recomeço: necessário. Por vezes enganoso, agora lustroso: um final digno, para ambas as partes. Uma desconexão tangível, consciente. Ao lado da árvores que sombreia, uma flor em nascimento. Desabrochando. Um sentimento? Uma alma, uma afeição? Sabe se lá o que morre para o que outro nasça. Ainda descoberto, o renascimento. De mim, ou de um coração? De ti, ou de uma intuição? O bom é que uma tampa se fecha, e uma planta agora cresce.
Hoje chove. Abunda água para as pétalas que necessitam viver, aos caules e raízes que querem insistentemente se fortificar. Ao falecimento, maior solidez. Que não é carnal, mas sim, afetivo. E necessário de eutanásia praticamente, quando era hora se foi: sem forças para respirar, nem respostas bem recebidas, uma desgastada paixão em estado terminal. Terminou. Alguma morte, ao lado de outra nova vida, nascença. Esperançosa, não temo que o floreio em andamento se ateie ou contagie por tão perto estar do imóvel; estacado. Com o passar da chuva, a abertura do tempo e o dia de amanhã, a certeza é uma: que nasce o sol. A flor que do lado agora se banha, lava a alma e prepara-se para o brilho no céu, radiará, vermelha e lustrosa: amor.

(Escrito de Janeiro de 2011)

Cupido

Seu danado, cadê você? Agora que te busco e em mãos não mais se encontra o passe livre para pisar nas nuvens e flutuar pelas ruas, apaixonada: o seu sumiço, então. É férias, porém, mais do que nunca, quero ser acertada, na loteria romântica, uma vitoriosa. Chega dessa sorte no jogo, que nada adianta ser então profissionalmente uma ganhadora e tanto, se com quem gastar das horas em companhia que me estremeça, é o que mais me falta.
Você, menino, e suas armas invencíveis, gladiadoras. Fortificadoras. Jeito moleque e a pirraça de não olhar atentamente ao jogar o tiro, e errar o alvo. Me pergunto se é com flechas que caças, ou simplesmente, com armadilhas. Arapucas sentimentais, que crivadas no peito doem, esfarrapam a alegria de beijos de amor ao pé da cama, debaixo do travesseiro. Iludem em sua maioria, gostam de enganar com sabor: tiram da mão, quando os dedos então tocavam o tão querido afeto. Erro crasso, coração despedaçado. Seguindo então o curso da vida, que mais se assemelha a um rio qualquer, unido em água, sangue e caminhos destinados, na espera de que a então malfeitora farpa saia do peito logo, e sem demasiada dor.
Mal de Parkinson não é, tão jovem é você. Um cândido que da infância não se desprende nunca - praticamente irmão de Peter Pan, apenas mais inconsequente, serelepe. Mira na pessoa exata, naquela correta, e sabe se lá se por força do vento, das intuições ou destino, acaba por errar a pontaria.
Quero seu bem, duvido que se drogue, como dizem. Apronta por puro contentamento, pela diversão. Quem sabe, para fazer com que aprendamos e cresçamos nesses relacionamentos cansativos, pela metade. Disseram que chegaste a talvez, se apaixonar por cada uma das belas damas que de sentimentos vazios, a você recorrem. Primeiramente anjo que és, duvido. Imagino seu sorriso a ver a felicidade de cada casal que formas, e com você o apego não é uma constante - tudo para o maroto muda; os ventos, as ocasiões, os pensamentos. A rapidez das suas asas dá o efeito dos tais arrebatamentos que não sabemos explicar: ostentadores. Para sobrevoar por aí, urgente, elétrico, e esperto, problema de vista sei que não é o que te impede de fazer boas ações. Fico com a opção de poder crescer no que não posso possuir. Esse é o ensinamento que empunha a cada proposital desacerto: amar com liberdade, e sem vaidade, como cantou tantas vezes Raul. Aprender a sentir de um jeito mais sadio e correto, quando sou só loucura e arrebatamento, paixão. Por vezes, imagino que tenhas também uma cota de flechas, destinadas a cada pessoa. E então, as de fazer apaixonar, para minha pessoa já tão penalizada, se esgotaram. Vai que agora os tais dardos duplos e complementares, do amor real, grandioso e destinado à dois, não entram em cena? Não desacredito você, querido Cupido. Pelo contrário, imaculo seu potencial. De estúpido, aliás, nunca o chamei. Sei que és esperto, basta olhar com atenção os tantos casais cúmplices e apaixonantes que gostaríamos de ser, e no fundo, invejamos, tão felizes e completos. Peço apenas que até pare de se esconder, e à cena retorne, em grande estilo: como meu amigo, e no objetivo, a minha felicidade. Apenas, volte. Sem ensaios para atingir de raspão, ou nas periferias que não são nunca o meio. Em sistole ou diástole: bem no meio, no ponto exato onde para todo o corpo se vá o que sente o coração. Venha e, sem me avisar, que a surpresa é ainda mais deliciosa, de repente no meio da rua, supermercado, barzinho à noite ou farmácia pela manhã, algum olhar de outra vivência, aquele arrepio de já conhecer o incógnito. E ainda assim, querer afundar nele.
Dizem que você não cresce, apenas porque o amor é que não envelhece. Talvez seja. E flechas no peito, o que representam então? Que o amor, para cicatrizar, também um pouco deve doer. Sem torturas, o frio na barriga que é essencial para valorizar a grandiosidade de uma afeição.

Tentação desgovernada


No meio da noite, sem nada esperar, e numa tranqüilidade de dar inveja a monge Tibetano, me surge a pergunta mais estranha, complexa e cheia de subterfúgios, feita assim depois de tantos dias: você é louca?
Paro por segundos, e analiso toda essa andança defeituosa, minhas últimas ações, os ultimatos, a fuga breve e com explicações capengas. E você, tão injusto, volta à tona com essa questão, num jeito bem rude, grosseirão mesmo, pedindo só uma explicação, no meio de toda essa raiva aparente e que me pega totalmente desprevenida de ataques pungentes, guerras sem aviso prévio. Uma dúvida intrigante, no lugar da declaração de falta sentida, amor mal vivido.
Entre responder ou não, pensei por um tempo, e a outra metade dos minutos foi puro charme mesmo; fingir mil ocupações, sobrecarregada entre tantos possíveis affairs, amigas baladeiras e minha super agitada vida que nem ao menos me condiz, quando na verdade, naquele momento, a única tarefa que me distraia era repensar toda essa história, e resolver o dilema de me mostrar viva, ou deixar a dúvida instigar um pouco mais. Responder fria, desentendida quando na verdade as palavras autênticas queriam sair, confrontar e mostrar que o insano aqui, é você. Deixei à tona meu lado meio gelado, e depois não controlei as explosões - como era de se esperar, lógico. Fui dormir com a pulga atrás da orelha, talvez um monstro embaixo da cama, ladrão que sobe pela sacada e entra no quarto, essa inquietação que já me é natural, centralizada: eu não era louca, coisa nenhuma. Quem sabe, transitória, dúbia. Porém, à beira da loucura, eu apenas observava num espelho o que a meu respeito não dizia - ele sim, um alienado, dos típicos. A necessidade de te escutar, o desejo de te invadir. Tua pose de me dominar, dos mil e um obstáculos que nos separam - tanto tempo depois - fingir nem ver: atropelar.
Bem verdade que eu ajo hoje, e em seguida me enclausuro para ler livros de psicologia, ouvir músicas poéticas e ficar sozinha; e amanhã volto com uma super-inovada-nova-solução para o nosso caso de amor dilacerante e pragmático. Talvez por isso, as fugas, e voltas, as idéias mudadas, o sentimento quase o mesmo e os princípios no lugar. E você disse que era inesperado, que tudo ainda estava sendo arrumando, no conserto, e do nada eu fui quem cortei o fio que nos ligava, cordão umbilical desse relacionamento subnutrido. Isso, na sua cabeça. Na minha mente, era incompreensível esse seu sangue tão frio de ainda agir normalmente, como se nada tivesse acontecido. Enquanto ainda me encontrava em meio aos destroços, assustada e sem saber como agir. Uma vontade de que aquele dia não tivesse existido, e fosse só um pesadelo ruim. Me belisca, vai. Daí, posso acordar, ler mais algum livros desses que ganho e guardo para depois e quem sabe quando dormir de novo, eu sonhe algum dia. Mas não. Não foi vingança, sabe. Foi só o pacto de fidelidade que tenho comigo mesma, desde me conheço por gente. De me entregar aos impulsos, deixar consumir essas vontades, arriscar. Sabendo ser o melhor para mim, na sua insistência em contato e proximidade, agi. Meio cega, um pouco maluca, mas uma pena que as explicações não tenham chegado à tempo. Conversados, você mimado e criança, respondendo com monossílabos irritantes, e eu na defensiva dos meus ideais, defendendo com louvor a dignidade que construí e minha sanidade, só me restou sair com uma frase de efeito e sumir por umas semanas. Guerreiros dessa vida que somos, gostamos de um bom confronto. Sei que tanto você, quanto eu, não fugimos da luta em meio à guerra.
Engraçado, talvez não, mas eu pago pra não sair de uma briga, essa teimosia herdada e protuberante, e você cria qualquer uma, adora uma boa discussão. Nem que seja se a melhor infância foi de quem comeu os chocolates Mania ou Kid Banana, ou quem brincou mais nas pracinhas, foi mais tempo à creche. Os times rivais e as gozações, um ama o ritmo frenético da metrópole, e o outro daria tudo para morar na praia, e essa sua paixão por cachorros, quando eu me prometo cada vez mais que quando morar sozinha, compro o furão da pet shop da esquina.
A gente sabe ser quase completamente diferentes, e ainda assim se surpreende com os motivos pequenos que nos fazem ter pelo menos uma discordância por dia. Se empenhando na habilidade de argumentar, ver o braço torcido do outro para depois mil cuidados e mimos. Fazendo o outro mudar de idéia. Mesmo que, nenhum dos dois seja genioso o suficiente para admitir. Duas personalidades fortes, que se admiram cada vez mais e insistem de olhos blindados no que nunca nem deveria sequer ter iniciado. Para sair disso, só depois de muito combate, ou de alguma outra pessoa que venha assim, aos poucos e ganhe uma das mentes difíceis: um relacionamento maduro para acabar de vez com essa tentativa frustrada.

Petulante.


Discutíamos. Momentos como este que que articulam grande força e intensidade, nossos acalorados debates, me marcam sempre a memória - já tão defasada, um tanto elefântica: enorme pro que realmente interessa. Entre punhos pressionados com força de onde poderia vir um golpe certeiro, gritos que transpassavam cozinha, a sala e o seu quarto, bem no meio dos olhos, como costumavas me olhar, proferiu: Sua...Sua petulante.
Pe-tu-lan-te. Que poderia ser nominada doente, louca, demente ou grossa, mas não. Uma petulante. Pétala ambulante? Uma personificação errante pra esses meus erros banais e corriqueiros: um pedaço de flor, caído ao chão sem se mover, derrubado pela própria impetuosidade. Foi como me senti ao quase beijar teu tapete, deitada no chão que já conhecia meu corpo inteiro; apenas junto ao seu, sob o brilho das estrelas quando a janela aberta, e o zelo das cortinas, no rigoroso inverno.
Perplexa, sim, permaneci. Sentada à cama, sem ação, nem revide. Vendo sua raiva de mim partir com você e sua carteira no bolso, a chave do carro em mãos. Os passos largos, apressados. Porta batida, estrondo. Sabe se lá para onde ia, imagino que, qualquer lugar longe dessa minha arrogância de viver que não consegue nunca calar o pensamento, ou o que sinto. Foi nesse meu atrevimento que o obtive. E aparentemente, na mesma ousadia de viver sem nunca me subjulgar, também estava nítido que perderia o que havia conquistado: você.
Recolhida na fúria de ser este mar singular onde se afogam os despreparados, e navegam os apreciadores de grandes venturas, abracei as pernas e chorei como criança perdida no mundo, desencontrada de pai e mãe. O desconsolo de não me resguardar, e com audácia, agir sem nem ao menos tentar um acordo com o pensamento. Eu é quem erro e prenuncio todas atitudes alheias, julgo quaisquer fatos que à mim não dizem nem respeito, tão pouco razão. Pronta sempre para o ataque, essa foi a última de nossas tantas discórdias. Da qual ainda tento fragmentar e esmiuçar, para que talvez compreenda onde que o erro encontrou falha, e nos fez cair para dentro. Nessa desgovernação que me acomete, e que nem entendo; apenas sigo. Foi a petulância em si, ou uma gota dessa água que ameaçava cair há tempos, e nunca víamos ruir?
Ao refazer o caminho da dança que foi o fogo de nossa luta, algum vestígio que fosse do que poderia salvar a minha culpa de ser vilã, para se tornar sua companheira do seu crime (quem sabe, noiva). Arco com o prejuízo de estar certa, para obter a glória de você de novo num jantar dos nossos, acordar ao seu lado e pensar: a vida é justa quando fazemos valer a pena cada fração de segundo. Até largo fora a cara de ser insolente, e amolecer a diretriz dessa minha urgência, para que depois do perdão, revigorados voltemos um ao outro: em paz, e com muito amor.
Chego a pensar que se lutamos, é para ter o sabor ácido e simultaneamente doce de fazer as pazes mais tarde. Petulante ou não, insuportável ou de TPM: você, a paciência enorme que acaba transbordando porque eu canso sim, mas recompenso. E bem. Tanto que a campainha toca, vejo flores no que deveria ser a sua face - agora, também arrependida - e abraço você com a ternura de quem segura o maior prêmio nos braços: o nosso amor como vencedor. Se te desculpo? Acho que te amo.

Práticas masculinas para 2011.

Vi no site da Revista Marie Claire - mais precisamente no blog Fale com ele - algumas resoluções que os homens acham válidas que nós, mulheres (me enquadro em tal categoria, e imagino que, 80% das leitoras do Kawacauim sejam do sexo feminino idem) coloquemos em prática no ano que ainda é recém-nascido. Nesse ritmo de renovação, de novas atitudes, e afins, me arrisquei. Listo então, alguns tópicos que as gurias também achariam ótimos se fossem postos em prática para uma melhor convivência entre seres de Vênus, e criaturas de Marte:


1) "Serei macho na medida certa"
Na minha opinião, homem de verdade, que não tenha medo de baratas e insetos, e não peça dicas de beleza, ou creminhos emprestados, está em falta no mercado. A macheza de um cara nada tem a ver com bancar o rude, ou ter voz grossa, e braços musculosos. Muito menos em agir como um caminhoneiro. Está no equilíbrio entre se cuidar e usar algo para higiene e saúde, e arrotar e palitar os dentes. Ponderar o homem ogro com o lado afeminado que aí dentro existe é um desafio e tanto. Por favor, sem pintar as unhas e demasiados atos de metrossexualismo - acaba anulando a virilidade masculina. Se cuidar e não parecer porco ou excêntrico são panoramas bastante distintos.

2) "Não implicarei com as roupas dela"
O crescente número de amigas que tem compromisso e um corpo legal e deixam de usar peças que gostam, e ficam bem com seu tipo corpóreo é de arrancar os cabelos, pirar. 'Não uso decote porque o mor não gosta', 'Ele disse que aquele vestido era muito curto' ou 'Prefiro esse biquini maiorzinho que mostra menos o corpo' são frases que tenho escutado cada vez mais. E me ultrajam. Se o cara foi capaz de fisgar o peixão que tá na rede, que cuide bem e não deixe escapar, oras. Ou não aguenta o tranco, e é inseguro demais pra levar muito areia no caminhãozinho? Nos poupem e joguem a cisma e o ciúme pra bem longe, viu.

3) "Deixarei que ela pague algo de vez em quando"
Há um grande número de caras machistas por aí, como todos sabemos. É inegável. Assim como mulheres machistas, e algumas feministas. Longe de mim ser estereotipada dessa maneira, até porque, não me complemento em nenhum dos adjetivos. Porém, não sei a maioria das gurias que lêem aqui, mas eu me sinto muito mal quando saio com um cara e, em todas as vezes, ele não me permite pagar nada, nenhum tostão. Se tenho meu dinheiro, é legal que eu pague algo também, de vez em quando. É como se a gente sentisse em conjunto o peso do dinheiro que está sendo gasto por uma só pessoa. Ocasionalmente, ela não ficará na pobreza se tirar um pouquinho da carteira, pode ter certeza.

4) "Não responderei monossilábicamente ou a deixarei falando sozinha quando numa DR"
Uma grande questão. Mulheres já possuem esse armazenamento infinito de palavras, tanto a serem ditas, quanto escutadas. E quando numa briga, argumentar e deixar a opinião bem esclarecida é fundamental. O foda é quando do outro lado se escuta apenas 'aham', 'é verdade', ou 'não sei'. Piora o quadro quando o cara sai no meio do monólogo, ou diz que já volta, e reaparece como se nada tivesse acontecido. Que os dois pontos se escutem, e cheguem num consenso. O ano é de Mercúrio, pessoal - quem leu essas previsões pra 2011 sabe disso, claro - e favorece as conversações. Quem conversa, se entende. Usufruamos!

5) "Levantarei a tampa do vaso antes de mijar"
Pelo amor de Deus, nem necessita explicação. Higiene é fundamental. Se tentar acertar a mira, melhor ainda.

6) "Tentarei ajudar nas tarefas domésticas, mesmo que furtivamente"
Porque o tempo de 'Amélia é que era mulher de verdade' ficou nas cavernas, em décadas passadas. Homens que cozinham, e lavam uma louça, ou sua própria roupa, estão em falta também. Ajudar não custa nada, e mulher nenhuma nasce com o estigma de doméstica.

7) "Não temerei compromissos, e os honrarei"
Isso vale pra casais ainda não nomeados, ou em início. Que vocês, homens, laguem de mão essa fixação em querer todas, e não ter nenhuma. É patético. Tanto que, mais tarde, muitos de vocês se arrependem, e não tem volta. Se num compromisso, que vocês não caiam no esquecimento do monumento que está ao lado de vocês - um pouco de romantismo sempre é bem-vindo, se sem exageros e pieguismos. E nada de olhar descaradamente pras mulheres bonitas que passam, é desrespeitoso!

8) "Sairei com os amigos, e deixarei você sair com suas amigas sem desconfiança"
Há alguns anos, a maior reclamação das mulheres era a de que, os homens acabavam muitas vezes saindo com os amigos, e as deixando quase com mofo, no sofá de casa. Acho que a inovação é algo que se expande a cada dia, e então, que os homens permitam sem ciúme e cobrança, que a gente saia também com nossas amigas. Afinal, relacionamento sem confiança mútua é um mato sem cachorro - ou melhor, uma troca sem benefícios. Se ambos não abusarem de tal resolução, tem tudo pra dar supercerto. O que não rola é esquecer da existência das amizades apenas porque se está de casalzinho (depois que acaba o relacionamento, a solidão é o único amparo).

9) "Não bancarei o brega"
Inclui não usar sunga, bermuda acima do joelho, sapatênis, e uma infinidade de cores num só dia. Pochetes, sandálias, calça skinny, meias pretas e porta-celular em couro, no cinto, também devem ser extintos do guarda-roupa. Pelo próprio bem do homem, claro.

10) "Compreenderei a TPM"
Aceitar esse período crítico para a maioria das mulheres é algo essencial, a ser colocado em prática. Até porque, depois de agirmos como o anticristo, recompensamos muito bem e com muito carinho quem nessa fase nos suporta. Mime, afague os dengos, a deixe sozinha, mas suporte. Você sabe que passa, eu sei que é passageiro. É uma dica valiosa pro futuro.

E por último, mas não como uma resolução, e sim como um desejo feminino, que os bofes de 2011 nos compreendam, nos surpreendam, nos apareçam na hora certa! Que estejam do nosso lado porque querem, e não somente porque não apareceu nada melhor. Façam café da manhã na cama, coloquem a nossa música favorita, nos beijem logo cedo, ou antes de dormir. Que aprendam a lidar com os percalços e as maravilhas de conviver com o ser feminino - tão singular, e dignificador dos dias do homem. Nos façam felizes, que a gente terá prazer de fazê-los ainda mais contentes, podem ter certeza.

(Espero que esse post não seja levado para o lado de 'a Andressa é feminista'. Não. Apenas que, tanto homens, quanto mulheres, são de natureza observadora e crítica, querendo sempre mais e melhor, de tudo. Se um homem foi capaz de ter essa idéia, por que não adaptá-la ao universo das luluzinhas? Além do mais, tudo tem um tom um pouco de brincadeira. Quando a gente ama, até os defeitos fazem a gente amar ainda mais e mais - é clichê, mas é de conhecimento geral.)

Cena.


Todos me calam com as desculpas mais do que esfarrapadas de equilíbrio, bom senso e sensatez. Tenho tudo isso, e só não faço uso correto, porque francamente, eu gosto é de ação. O filme excêntrico que planejo e me saí do controle; faço o casting e me surpreendem com faltas e aparecimentos, mocinhos que se demonstram vilões e assassinos perigosíssimos que não passam de passionais convictos, tresloucados do amor. Cenas cortadas quando o certo seriam seguir seu fluxo habitual, rotineiro e incansável. O que me exapera é a falta de partido, a comodidade das massas. Ricas, humildes, simplórias ou refinadas. Esse silêncio medroso que não fala, e ao mesmo tempo traduz-se em repressão, freio de mão ativo que pára antes da chegada do temeroso descontrole, dessa frenecidade de viver sem se culpar; se incriminar de ser humano, possuir emoções e se dissipar de tais armadilhas, motins pulsantes.
Delícia mergulhar na intimidade de não limitar-se, se expor ao habitat natural como veio, à que se destinou. Sem ornamentar frases para não machucar, florear segundas, quiçá terceiras intenções. Sair pela porta da frente, sim, quando não atingido o previsto - planos mutáveis e suas câmaras secretas. Cabeça erguida, olhos turvados à frente e nenhuma inquiedade. Quem não aceita o gosto amargo, não saberá apreciar o adocicado mais tarde; sobremesa recheada de invidualidade.
Meios-termos são pra pessoas que passam despercebidas toda uma vida, que nunca sentiram na pele a adrenalina rolar e fluir, tomar conta e cegar. É para aqueles que não nasceram com alguma luz, ou brilho, que não despertam nada: nem ódio, nem amor. Indiferença, talvez. Tédio e constância numa vidinha arroz e feijão, sagu e ambrosia. Coisa mais clichê, sem sal (nem pimenta), sem graça alguma! Não queimar a língua, e o prazer de sentir horas depois de volta o gosto úmido dos alimentos, ou de salgar tanto a vida, as atitudes, incoerências, que a água venha como um banho, purificação...
Vida em preto e branco, vida sem graça: vida meio-termo! Metade, mais ou menos, tanto faz.

terça-feira, 1 de março de 2011

Presente

 

Quando você questiona, se por fim, me ganhou, sinto é vontade de subir ao pódio junto e compartilhar não o primeiro, mas todos os lugares, assim: junto. Se dou espaço à insegurança vez ou outra, é puro charme. Quero que a liberdade te aponte até mim, mas não forço: deixo que a vida siga seu curso, que bossa permaneça sempre nova, e que, se o caso seja, cada vez mais seja eu chamada para figurar nos seus dias. Digo que só aceito a sua vitória se ela for minha também, como pura verdade de quem se fechou tempo demais pra quaquer sentimentalidade e - aos poucos que tem que ser - reflora, reacende. Vive. E assim, é que tem sido: à flor da pele e sem muito espaço pra deixar que o pensamento, cheio de suas lógicas e razões, se infiltre. Brechas, sim, para felicidade e sorrisos, e mão na perna, cócegas e beijos. Se penso em presente, primeiro vem a leveza desses dias onde são leves quando tem sua participação, e áridos, quando não, e claro, você. O presente, dentro do momento atual. Que, sabe, tem melhora garantida nesse meu humor volúvel - que, com você, sempre tão delicado e suave - e em pele e cabelo, costumes e pessoas. Meu sono, sempre tão caótico, agora é existente - e sereno, o que é praticamente um milagre. Tanto que dialogo, e divago, viajo e desconheço aonde tudo deixou de ser realidade, e passou a ser sonho mesmo. Sonho meu.

Então que desenlaço devagar toda a trama dessa história que se desenrola sem nem ao menos ler o manual de instruções - que me surpreenda no caminho. Temo que qualquer atitude mais brusca, frase desconexa, dê defeito e faça sumir qualquer construção de afeto que tenho nutrido, depois de tanto tempo inerte à essa sensação de paz mista com loucura. Porém, contente, carrego pra lá e pra cá a expressão que por mim fala e aos poucos descubro existir: um festival de bom-dia, e tudo bom, sorrisos amplos e disposição - não tanto pelo café, mas sim, por esse sentido maior por trás de tudo que nos faz avançar e palpitar o peito, intuitivo ocasionalmente. E que me fez agir, e tentar, mesmo sem saber, mas sabendo o tempo inteiro, o que suspeitava valer ainda mais que o sabor de uma simples conquista. Aos poucos e atenta a todo e qualquer movimento, é que tenho me libertado do pedestal de ser inalcançável e exigente a que me impus e descido, com os pés firmes no chão e fugir do que o cotidiano nos oferece. Sem me entregar totalmente ainda, até saber direitinho e sem engano o que fará você com o que receber, apenas para não iludir. Mesmo sem saber até que ponto se está dentro disso que vivencio, mas ainda com claridade, agradeço. E presente, quando recebemos, requerem ao menos um obrigado. Menina obediente que sou apenas ocasionalmente, tenho o feito e em troca, ganho a consciência livre, solta para correr longo dos assuntos aqui do peito.

Com cuidado para que não se quebre a magia do encanto, e muito menos enjoe, é que tento cultivar o magnetismo que tem em ser elevada a um nível de aventura, harmonia e sorte, assim reunidos, intensos. Sem passado, pra servir como papel determinante, nem futuro, expectativado e logo, tortuoso: o agora é o que mais quero. Daquele meu jeito imediato de sempre, suprida, talvez, como nunca. Porque é na sua tranquilidade imensa que a minha paz se reencontra e recarrega - que desastrada, uma louca, você sabe. Que sente cócegas, e ri das meias, das medíocres pessoas, de tudo. Nesse seu jeito pacato que o meu desatino é fisgado, se abriga, e então, se anula: o bem que você me faz, o que nenhum outro fez, jamais.