quarta-feira, 29 de junho de 2011

Quando até o menos é soma

Uma vez, e não faz tanto tempo, alertaram como quem tenta salvar antes da inundação: ó, desse jeito vão enjoar. De novo ele? Mais uma vez? Vai cansar de você. Dá um tempo, respira longe, liberdade pro outro. Mas minha parte eu faço, oras. Fico um tantinho longe, faço mistério, trago novidades. Se a vontade de ficar juntos é uma constante e só aumenta -e nenhuma culpa nos chega, nenhum aviso é motivo plausível para briga qualquer coisa do tipo maléfico que tente uma separação precoce - que se há de fazer? Matar o tédio em conjunto, desmistificar o lado ainda não trajado do outro, deixar no seu colo as minhas horas para que você usufrua com apetite voraz os dias que nos são brindados em acabar com qualquer resquício de saudade nascida dentro das burocracias da semana atribulada.

Sei que, ao invés do tédio, uma vontade de ser assim pra sempre, não ter que largar nunca esse princípio de coisa que nasceu já certa e mesmo quando aperta, até quando ocasionalmente discorda, é um pedacinho perfeito de céu estrelado no meio de tanta nuvem escura. É muito querer pra um mais do mesmo - e que tem assim sido há semanas - em que não canso, nem desejo que pare: numa conta exata onde sobra muito pouco, e tanto se soma, acredito que quem sai ganhando somos os dois. E mesmo cheia de lucros e aprendizados, um sinalzinho de adição qualquer martela a cabeça, uma voracidade violenta qualquer não de pertencer ou estancar, mas sim dessa forma que tem sido continuar agregando até mesmo quando parece que se perdeu. E se encontrar até quando o menos, se torna de repente mais um pouco de nós. Dois.

Mais de você me cuidando para não sentir frio demais, esquentando minhas mãos quase sempre congeladas e me dando o chinelo felpudo porque é mais quentinho. Mais de nós dois nos olharmos até que o outro se desarme e sorria (ou eu pergunte "o quê?" e estrague a fascinação que, internamente, tilinta o momento). Mais a gente apertados num mesmo sofá e tapados num único cobertor - imergindo a preguiça um do outro e comentando com um humor de recém acordados os filmes ruins e seriados mal dublados. Menos gente se metendo e opiniando com velhos conceitos e novidades "bombásticas" por nós dois já conhecidas - e tão cúmplices somos, nem imaginam. Mais carne para você, e vinho para mim. Menos as ruas disformes e minhas meias-calças rasgadas ocasionalmente, mais de a gente torcendo um pelo outro, e se achando as criaturas mais lindas da face risonha da Terra, e querendo um ao outro que tá mais que ótimo. Mais você me buscando, e eu entrando no carro com a carinha de quem respira aliviada por tem algum refúgio dessa vida assoladora. Menos responsabilidades e aulas inúteis, mais nós dois pelos bancos da faculdade. Menos os dias de semana, mais os dias que a finalizam. Mais bergamota, menos tomate cereja (para mim) e cebola (para você). Mais o seu pé sem meia, menos eu quase caindo - e você avisando - da cama. Mais fotos de quando éramos pequenos e a vontade de se conhecer desde sempre, menos por não poder voltar no tempo e arquitetar algo que fizesse isso acontecer. Mais do seu perfume que me tira os sentidos, menos ele na minha pele e você já pelas ruas, distante. Mais de todas as carinhas que faço, e você se diverte; menos por não poder assistir nenhuma delas. Mais a medida das mãos, uma na outra. Mais deixar você livre e ainda assim, ver que assim como é você pra mim, muito mais que opção: uma escolha. Consciente, tranquila, bem-feita, contente e cada vez mais acertada, essa coisa de pecar por se querer assim perto quando dá, esquecer o mundo por ter nas mãos algo muito mais interessante. Uma porção de nós dois, por favor. Sempre.


quarta-feira, 22 de junho de 2011

Nem santas, nem vadias: livres


Que consentimento carrega uma saia mais justa ou blusa decotada de, um mero cidadão desconhecido, além de infringir o meu corpo, se achar capaz de passar por cima das minhas próprias regras? O que denuncia o desejo feminino de se sentir bela como indicio de que, está pronta e afim de ceder ao sexo justo naquele momento, sem conversa ou permissão? A roupa que vestia, o estado alcoolico em que se encontrava, o caminhar sozinha em horário tardio são algumas das baixas desculpas que uma sociedade retrógrada expõe às questões de estupro ao mesmo tempo que tolera um humorista que declara, infelizmente que "homem que estupra mulher feia não merece cadeia, e sim, um abraço". É por essas e inúmeras outras questões que mulheres, esguias ou fora dos tão exigentes padrões, realmente vadias ou púdicas (por que não frígidas?), solteiras, casadas, mães, homossexuais e de todas as possíveis e mais diversas características tem se unido com trajes provocantes e alguns cartazes igualmente apimentados e questionadores mundo à fora em forma de manifesto para execer livremente o direito de se produzir como bem entender sem serem codificadas por machos sedentos e inapropriados como um convite silencioso e obrigatório para o que deveria ser "o amor em sua forma prática", ou "reprodução de vida" (quando na verdade, muitas quase é se vão nesse atentado agressivo a qualquer pudor feminino).

O movimento, que se deu início no Canadá com a revolta gerada ao comentário de um policial local que orientou universitários dizendo: "Se a mulher não se vestir como uma vadia, reduz-se o risco de ela sofrer um estupro". Expor tal visão machista e errônea a uma platéia composta por jovens damas que assistiram desde pequenas à tomada de poder de suas mães tanto em chefiar lares e fogões, como possuir também uma maestria até então indescoberta em não só pilotar panelas e fogões, mas também carros e grandes empresas. Depois de sutiãs queimados e tantas voltas que o mundo deu, uma igualdade adquirida à duras penas por figuras corajosas que não se impuseram e deram a cara à tapa afim de, mesmo com traços delicados e cabelos compridos, ter os mesmos direitos de seres do sexo masculino. Que talvez hoje, nem muita coisa adiante às moças que são praticamente obrigadas a escutar palavras de baixão calão, sussuros empapados em saliva tarada e olhares maldosos e maliciosos que se acham e supõe cheios de razão em o fazer? Mulher que revida é tida como ultrajante, inconsequente - até mesmo mal amada, feminista, "sapatona". Quando na verdade, o desgosto maior é ter que andar olhando para o chão e com a maior discrição possível para não tentar chamar atenção daquele tipo de macho que pensa que só por estar produzida ou bem arrumada, se deseja um "elogio" grosseiro e mal colocado. Das independências conquistadas ao longo dos anos, a de não poder dizer um "não" que soe e seja realmente uma negativa aceita. Esse cárcere de não poder escolher, dizer ou até mesmo obter quantos e quais parceiros bem desejar, por ser tomada não como um ser em um corpo com vontades e impulsos, mas sim, apenas uma vagabundas, sem direito à revisão de alma e motivos, e muito menos, compreensão.

Por que rotular e seccionar mulheres entre "vadias" e "santas", quando deixá-las livres é melhor negócio tanto para sua própria expressão (e não repressão, leia-se bem) sexual e emocional, quanto de escolhas e opiniões? É ganho tanto para as moças de saia, quanto para o lado masculino da população. Quer dar uma relaxada? Beba uma cerveja, procure os amigos, vá jogar sinuca ou no sagrado futebol de quarta-feira à noite. Anda precisando de sexo? Caso não tenha parceira, companheira, ou alguém disponível, desembolse; pague. Agora não pense que apenas por ser vaidosa toda mulher é fútil ou idiota e merece ser prevalecida de uma força a qual não pode lutar contra.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Silêncio


 


Permaneço tempo demais olhando, séria - até mesmo, cética - justo porque não sai. Sei exatamente o que devo falar. O que quero. E não. Nenhuma sílaba, sumiço de qualquer vestígio daquilo tudo que eu idealizo que vou dizer, não aguento mais, e você merece ouvir. Coisas boas, não há o que temer. A não ser, há sim: e se essa minha profundidade em larga escala, já tão condecorada em assustar e te levar pra longe, aos poucos e de repente? Estou despreparada para colocar tudo a perder na fogueira dos sentimentos que não sabemos até onde vão (e se confessáveis são). Fico então - eu que não o sou - estática, olhando bem fundo os detalhes que compõe esse segundo à minha frente em que não decido se digo, ou calo. E acabo ficando com a terceira opção, subliminar: rio. Porque você ri também. Tempo demais no silêncio, além de dar corda às artimanhas internas para que se arquitetem sonhos e dissoluções, enigmas, esfinges e misteriosas questões, nos dão vontade ainda maior de viver com afinco. É que...Deixa. O tempo pra mais tarde, a fala pra outra situação. Eu, a quem as situações já pisotearam a sinceridade espontânea, fico toda amedontrada de receber qualquer negativa. Tenho pavor ao não, logo, me incluo na turma dos positivos ingênuos, passiveis de sims e órbitas encantadas - onde tudo é possível, as possibilidades se ampliam.
Mas você continua a me olhar e não dói, posso quase dizer que liberta. Mesmo eu que falo demais e sempre, e tento trucidar qualquer segundo de inércia ou mudez saliente, há esses momentos em que ninguém precisa falar nada porque é só passar as unhas pelo teu rosto ou encontrar o ponto exato onde a sensibilidade aperta para que logo em seguida, quebrando os raros instantes de quietude, você me ataque - não ferroz, mas como quem experimenta da comunhão divina que é compartilhar as poquíssimas oportunidades onde impera aquela serenidade despretensiosa, tão diferente ao silêncio de um abismo de quando um de nós dois desgosta de algo. É nessas horas onde capto todos os detalhes seus, sem música de fundo, voz ou o barulho da ruas da cidade, das luzes apagadas e apenas frestas de dia nascendo tentando nos iluminar, assim na trajetória de redescobrir qualquer coisa sua que eu talvez ainda não saiba, que a única certeza é a de estar experimentando um pedacinho do paraíso e desejar que isso não acabe nunca.
Com tudo aquilo que nós é contra, e do pouco (mais forte) que nos favorece, guardo sempre o registro visual desses flagrantes da felicidade sendo possível, terna e estável. De ver o seu sono profundo de anjo salvador e tentar o desafio de despertar o seu descanso para aproveitar um pouco mais o tempo escasso juntos. De discorrer sonolenta frases sem nexo que você tenta reordenar nesse quebra-cabeça que é a minha mente confusa. De ir do vinho até a água numa madrugada só, com os olhinhos ainda mais diminuídos que tanto você adora. De bergamotas e caminhos errados, filmes ruins e despedidas intermináveis: silenciosas também, onde a única coisa que digo é que não quero ir, enquanto ensaio uma ida e a gente se beija, e acabo não indo porque você me bagunça o cabelo e eu saio daquela minha maneira desastrada e lenta de quem abre a porta querendo correr de volta pro carro. Desses silêncios que a gente às vezes divide, mas que apenas nos unem e fortalecem mais ainda. Cheios de certezas e doçura, alguma recuperação sonolenta dentro de cada manhã.



sábado, 11 de junho de 2011

Ao frio que tanto odeio



Agora que você já veio, me fez descer do armário as roupas que não gosto tanto e nem exibem como de fato é minha silhueta, além de uma gripezinha aqui, em conjunto a algumas tosses furtivas acolá, já pode ir. Pra que durar tanto tempo? Quase seis meses em que nos vemos degradar aos poucos de cor (a pior parte é a pele morena ao gelo, e por fim, ao bege quase pardo), parecer mais acima de qualquer peso, e vestir camadas e camadas de roupa - é quase ver se ir com a ventania ferrenha aqui os cuidados e caprichos tão cadenciados com a estética, na fase agradável do ano (leia-se: verão e primavera). Os dias cinzentos e aquela vontade desoladora de ouvir o repertório para cortar os pulsos, mesmo com a felicidade ali, na manga; palpável e absoluta. Nostalgia, nó no peito, vontade que só o cobertor de orelha tem capacidade de extinguir. As mãos congelam, e pedem luvas. A boca racha, e clama por manteiga de cacau, protetor solar, batom ou qualquer coisa que não deixe sangrar. Os cabelos, ou ressecam, ou se permitem o oléo que no verão não existe (tão bem faz a água gélida tanto a pele, quanto a fios. Impossível no inverno). Você quer tomar banho, e quase congela. Entra no chuveiro, e pretendo morar submergida na parte aquosa do banheiro. Sai, e é logo invadida pela friagem novamente. Fortes sensações, essas da temperatura baixa. Há que se ter coração forte, vontade empunhada e um tanto de saúde em dia, com certeza. Salvam e aquecem: café, chá, chocolate quente, foundue e sopa.
Na hora de sair, mais aperto. Se não for de guerra, bem possível que a vontade de ficar debaixo das cobertas, quentinha na cama, impere. Quer se sentir sexy? Complicado. Não esqueça o casacão por cima: uma obrigatoriedade, claro - e que ficará na chapelaria de qualquer casa noturna que você invente de entrar. Tentando sensualizar, você treme. Fala, e é possível ver no ar a fumacinha que faz cada sílaba proferida. Dia de prova no ápice da estação: espirros, catarradas, narizes que escorrem, e logo mais, são assoados. Repugnante, um nojo. O sono aumenta, assim como a fome. E os alimentos? Todo um arsenal que pede que a dieta seja interrompida já, no presente momento. Densos, com milhares de substâncias capazes de a fazer perguntar, quando chegar a primavera: cadê aquele corpinho enxuto e até mesmo tostado antes de toda essa parafernália começar? Se enfurnou dentro do armário, com as peças que realçam as curvas e apoderam a auto-estima que agora se esconde por trás de meias-calças grossas e blusões de lã. Coloque uma touca, está terrível lá fora. Que mão gelada, está agasalhada? Compre um par de luvas. Durma de meia, os pés se aquecem mais rápido. Aliás, o sono, esse vilão: quando fortemente por nós pego, difícil de largar. Despertador que toca, toca e toca, e você ali pensando: só mais oitocentos e noventa e dois mil minutinhos, por favor. A vida chama, não dá. As responsabilidades, além de prosseguirem, teriam que se adaptar ao slow motion que é viver quase congelando a todo instante. Ou pior: se ambientando no quentinho de casas, bares e ambientes, e tendo que enfrentar o ar gelado que bate na face. Dualidade demais pra quem não se divide quase nunca.
Acha de bom grado conviver com as quatro estações? Troque comigo. Venha viver na pele - e adoecer, possíveis são todas as doenças respiratórias e alérgicas de se adquirir ao menor sinal de imunidade baixa - esse looping de sensações térmicas que me abriga. Só não tome vinho demais, que este até aquece e alegra o momento, mas um adendo: no outro dia, a dor de cabeça é grande e a tontura, uma consequência. Já que veio, pode ir. Mostramos nossas botas, vestimos todos os casacos do armário na tentativa de não repetir e usufruímos das enfermidades, caldos, sono pesado e degradação corpórea infernal dos dias inertes. Falta muito pro suor escorrer na face ou embaçar o óculos na praia, e pro povo se permitir algumas vulgaridades que só o verão nos dá? Que venha. Logo.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Dos afastamentos



Sei que de minha parte não se iniciou esse processo de separação já anteriormente nem imaginado. Bem verdade que o tempo, de tão apertado, anda corrido e tanto minha disposição, quanto momentos disponíveis não são mais os mesmos. Aliás, diminuem gradativamente: acumulações se atribulam, alguns percalços pedem ajuste, gente gritando daqui, sentimento puxando do lado de lá - tem sido mesmo difícil satisfazer, mesmo com todo meu amor imenso e coração errante, as demandas daqueles que figuram como favoritados depois das sete chaves, do lado esquerdo, quase no meio do tronco. Os dias tem ficado cada vez mais frios, e me congelado junto, será? Cansei de correr atrás, só tenho suportado quem me compreende sem aquele esforço descomunal (e sim, simples), porque tudo que mais desejava é que, no momento em que o ritmo apertasse e o fôlego começasse a cessar, eu tivesse a quem olhar apenas de rabo de olho, sucinta e prosseguir na maratona que tem sido a vida.
Daí, que desses dias de sol no meio do quase inverno que tem perpetuado, mesmo com essa minha felicidade estável (surpreendente), algumas decepções. No profissional, não mais aquela gangorra de se dar bem de um lado, e mal do outro: é admirável o equilíbrio que tenho me esforçado pra manter. Na saúde, ando bem. Estética, todos os cuidados possíveis para melhorar, cada dia mais (eu, que tenho a ambição como uma aliada, sempre). Do lado romântico da coisa, tudo cada vez mais florido e contemplado; aquele sossego que eu, mesmo mulher e menina, até mesmo desprezei em outros tempos. Ou observava com certa desconfiança: não existe, quanta sem-gracice. Que nada. Tanto existe, como faz bem. Veja a melhoria em meu humor, a seda que anda meu cabelo, as tantas sensibilidades a que tenho me permitido. Tem sido maravilhoso, tem cada vez mais eu contente, e claro, tem gente que se afasta. Seria alegria à essa alegria alheia? Ah, agora você está em boas mãos, tchau. Pronto, já que você anda leve quase como um fantasma, farei que não a vejo. Cadê aquela cumplicidade toda, as milhares conversas madrugadas à dentro, regadas de cerveja ou espumante? Os segredos partilhados, o bom alinhamento da convivência? Foram pra baixo do tapete as fotos de quase dez anos, os laços fortificados que tanto já tentaram romper, e nós, mesmo quase completamente diferentes, seguíamos acreditando? Já se tornara mesmo tão frágil e quase morto isso de deixar falir o que um dia foi amizade, e num último estágio se transformou sem qualquer olhar atento a apenas mais uma associação, cheia de interesses e comodidades por trás? Desacreditava em amizade que qualquer ciúme derrubava. E parte, assim como consciência, estão comigo e em bons estágios: uma feita, a outra tranquila. Há erro em vivenciar da vida o melhor, e tentar, feito equilibrista conciliar companhias de anos, e simultaneamente, o sorriso dos meus dias? Pecado pode ser isso, de condenar com severidade quem abusa de certa inocência em viver, quase descabido de si próprio.
Se de um lado há quem se afugente desse meu estado sublime de conduzir dias corriqueiros e finais de semana, existe uma parte de mim que quer correr sabe-se lá pra onde; pra longe. E acaba ferindo quem, com cuidado e proteção sustentou por uma vida. Desse meu desejo de crescimento instantâneo, de impor maturidade onde ainda vêem a garotinha de dentes muito separados pedindo um pouco de atenção. Gente que foge dali, eu escapando sem rumo pra um único refúgio descoberto recentemente. Como cantam os fados portugueses, tão familiares a mim que sou descendente direta, e como Maysa contestou naquele episódio em que morre seu primeiro marido: dão de um lado, e fazem questão de tirar do outro. Dos cortejos e mimos de amor a que me baixei a cabeça e agora recebo, alguma perca do que antes me era essencial também: certa fraternidade que não me satisfazia, mas apaziguava. E daquelas que, não me compreendem os silêncios ou as tentativas de ressureição daquilo que numa memória não tão longínqua foi coisa viva e me quis bem assim, atônita de tanto bem. Quebra-cabeça essa nossa vida, onde com tempo e paciência, as peças e pessoas, situações, fatos e atos se acumulam e resolvem; quando não por nós, por si mesmos. Adultos e sábios da importância vital de se resgatar aquilo que compartilhado, faria multiplicação. De felicidade.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Tranquilidade

Milagre é que você me veja como pessoa calma. Eu, que desde sempre fui acometida pelos caprichos do imediato, que satisfazia aos mais urgentes desejos próprios, de cabeça baixa - porém, sem graça -  concordo. Puro aprendizado, ou quem sabe manha, feitiço, veneno, algum toque seu? Vai saber. Bem verdade que tenho deixado que a paz se instale. Quase não a dirijo a palavra ou detalho sua estadia; a dei o vasto espaço que ser transitória e ver de tudo mas nada possuir ocupava aqui, internamente. Se veio esse estado de serenidade atual, chegou ao mesmo tempo seu. Ou será que é mesmo você esse lugar pra onde eu quero que as horas corram e eu encontre de uma vez; e se arrastem, enquanto beijo tua nuca, me sinto protegida com o seu braço em torno da minha cintura, compartilho silêncios que não ferem nem agitam, apenas compreendem? Só pode ser.
Caminho pelas ruas captando cada cena exata, em stop motion, desse pouco que a gente tem um do outro, mas que deixa sorrir quase uma semana inteira. Com aquela saudadezinha que sufoca e incinera por dentro, mas afogamos do jeito que dá. Por mim, todo dia captar um pouco dessa sua tranquilidade linear - como não são as ruas da cidade, já te disse (e minhas meias-calças bem conhecem) tomaria para si o significado da palavra perfeição. Exata. Que é assim que tem sido, e nunca comigo antes foi: espero por saber que virá, vou por saber sem medo nem culpa, muito menos dúvidas, de que é recíproco. De que planeta veio você, que mesmo tão diferente de mim pensa parecido, trouxe a tão ambicionada paz de espírito e me faz querer ficar admirando por momentos intermináveis, quem sabe para sempre? De longe, de certo. Mas que tem tatuado um pouco de azul espraiado, tranquilo, por cima da minha maneira selvagem de querer tudo pra ontem, pra já. Arquitetado comigo, além de planos de fuga, conversas sinceras e sentimentos semelhantes para que se solidifiquem, enraizem, no mais seguro dos caminhos se perca. Para ganhar.
Por isso moço, continua, vai. Falo enquanto durmo, me machuco com frequencia maior que as pessoas normais, de vez em quando me torno mesmo uma fera dócil de domar. Não me tira esse segredo de ser simples e desejar com calma, que é o DNA vivo seu dentro da minha existência. Rega essa harmonia sua agora já plantada aqui, só para quando florescer ter alguma chance de ser seu sossego também. Fica. De meia, de cara, com gripe e comigo. Que te cuido enquanto você desse seu poder sobre mim, me aquieta, sossega. Prossegue sendo a parte bonita em que eu esqueço o mundo dos instantes mágicos que a gente não pode deixar passar: valem mais que qualquer momento de charme em vão, já tão notável e descarada essa paixão que segue e cada vez é mais um pouco da gente. Mesmo com direito a todos os obstáculos do mundo, cada vez maior. Intangível.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

To Marilyn


 

Que deu em você pra se ir assim tão cedo? Poucos sabem, mas mesmo por trás dessa beleza infinita, e tão inveja por nós, mulheres, havia alguém com sede de aprendizado. Desacredito que as milhares de fotos em que lê livros, revistas e scripts sejam à toa. Das suas biografias que pude assistir e folhear, a perpetuação do mito de ser ainda mais que o rosto de boneca e o corpo curvilíneo invejável: alguém. Estão para lançar uma coletânea de escritos seus há algum tempo. Lá fora, já está nas mãos - e na linguagem - do povo. Por aqui, ainda nada. Quero tanto poder ser leitora de seus fragmentos e conseguir decifrar um pouquinho que seja da personalidade irradiante que representou ao cinema, às artes, à fotografia. A verdade é que você nos deixou cedo, mas como tanto sonhou, estrela: em grande estilo, lindíssima.

Daquele seu medo de solidão, se viva hoje, uma multidão de admiradores, fãs e gente que te colocasse no colo, e desse todo aquele carinho escasso na infância, em retribuição - o que nos falta hoje, é dado amanhã; confio demais nisso. Quem sabe mesmo até a sufocassem, ou enlouquecessem: há maldade hoje, sim. Porém ruim foi quem conseguiu, nas distantas décadas e no que era incomum para o tempo, deixar que os vícios a acometessem, e que a ideias paranóides na sua mente já confusa se instalassem. Veja bem, você era boa. De uma inocência até mesmo incoerente, para quem realiza caras e bocas, e frases ardentes em filmes luxuosos. Por dentro, tão menina quanto o maior mulherão que amostrava ser externamente. O caos em forma de diva.
É sem pena que escrevo tudo isso. Em sua passagem pelo mundo - o que faz algum tempo, claro - e ainda assim, uma admiração tamanha. Um acervo rico em detalhes e trabalhos, cartas e amores intensos. Que deu em você para largar o bom marido que a queria em casa, como moça do lar? Sede de trabalho. Que pedido foi aquele para que o escritor, então seu conjuge, sobre você não redigisse uma linha que fosse? Autopreservação. E as ligações urgentes, imploradas, ao então presidente dos Estados Unidos da América? Um suplício, a fome de ser primeira dama e ampliar a importância glamourosa a que exércitos chineses e filas e filas de gente à beira de tapetes vermelhos lhe dirigisse.

Marilyn, das suas peripécias, à sua loucura doce, do seu batom carmim berrando vaidade ao seu vestido que esvoaça naquela sua cena marcante, do seu salto propositalmente cortado de um lado para requebrar melhor o andar, a glorificação de um ícone, o amor incondicional que acarreta jovens que tem apenas a possibilidade de se deliciar com sua voz e imagem por filmes antigos em DVD e aqueles de mais idade, que a puderam ver no cinema (ou mesmo ao vivo). Tantas almejam um pouquinho que seja desse seu brilho, da leveza com que atuava a senhorita. Não tem, nem de longe conseguem. Você, que com tanto fervor desejou pai e mãe decentemente, que ousou ao posar nua em segredo, e mesmo casada, para fotos de um calendário da época. A responsável por nos fazer ainda mais orgulhosas de que, com certeza, os homens preferem as que tem personalidade e um pouco de volúpia dá ainda mais charme e sedução, imperecível e atemporal, ainda encanta continentes e criaturas com o estonteante enigma de: por que tão magnética, Mrs. Monroe?

Outro famosa cena sua é o polêmio 'parabéns a você' cantado em palco e festa ao então seu affair, J. F. Kennedy. Uma grande musa, ao homem que, em termos de poder e política, foi também monumental. Hoje então, quem a deseja sou eu, mesmo finada: happy birthday, Marilyn Monroe, happy birthday to you.