segunda-feira, 9 de julho de 2012

Maria Elena, uma possível grande amiga

 


De repente tem eu falando sobre como fui bem na prova graças a Woody Allen, Penélope Cruz, cultura e cinema. Tem o professor dizendo que, muito tentou, mas não consegue apreciar o humor crasso do velhinho mais fofo desse mundo (a meu ver, sim). E a professora argumentando que também adora o diálogo inicial de Annie Hall, e que Maria Elena é engraçadíssima. Digo que adoro a personagem, porque as pessoas precisam dessa intensidade meio turbulenta e irracional que a atriz espanhola desempenhou tão e tão bem. Olhos arregalados, surpresa, polêmica em cima dessa minha declaração, eu voltando pra casa no ônibus vazio com as ideias conectadas: seria uma grande amiga, essa louca que quis matar o marido, retornou pra insatisfação crônica de uma relação com gosto de sucesso, mas fadada ao contrário.

Fico sempre do lado dos permitidos à insanidade, não adianta. Das vozes que ao invés de falar, gritam, gesticulam, quase deixam o coração sair pela boca, incalculadas palavras. Vivem sem meios, nem termos, nem mornos: jogadas na selvageria dessa modernidade de etéreos afetos, insatisfeitas pessoas, confiança abaixo de zero. Dessas mulheres que, autênticas em excesso, amedrontam espaços e situações, abalam certezas e cruzam os braços simplesmente porque fariam muito pior caso o livre arbítrio deixasse de ser visto como crime. Espanto as pessoas toda vez que resolvo defender ciumentas, paranoicas, incansáveis e incontroláveis - também - apaixonantes mulheres. A maioria delas, indomadas numa contemporaneidade onde mulher que quer vida amorosa feliz e o cada dando valor tem que ser fria mesmo e seguir as regrinhas de convivência das "pessoas normais".

Não, não como exemplo: e sim, uma pontinha de identificação. Como é conseguir ser fria quando o sangue ferve, a cabeça parece perdida e lá se vai, e fala. Lá se foi, e fez. Tchau, engole o choro, sua boba. Esquece o drama, sua louca. Pensa e depois age, doentia mania de se jogar só pra então, os caquinhos todos espatifados no chão, chegar a conclusões do tipo "puxa vida, olha o que eu fiz" ou "e se tivesse esperado mais tempo? ou menos? e não feito nada? que ruína". Desconverso sempre pro lado nem sempre tão bom, mas que consegue chance de ser compreendido, se no mínimo fosse avaliado. É assim porque é ingênua. Age dessa maneira por puro medo. Fala demais, mas é espontâneo. Grita somente quando é necessário se fazer ouvir. Dramática, mas criativa. E com certeza tem um jeito tão doce de pimenta nas horas em que resolve ser só sua. Mais certa ainda do que digo, é uma apaixonada convicta que, feito Narciso, fica cega com a beleza estúpida que tem um amor sincero desses. Dona do temperamento difícil mais mamão com açúcar quando elogiado, com massagem nas costas, chocolatinho ou abração de urso. Derrete.

Seja Barcelona, aqui em Vitória, São Paulo, Buenos Aires, Istambul. Minha admiração por possíveis amigas que compreenda essa inquietude, as paranoias furtivas, momentos de encanto, minutos de loucura e caricatas caras e bocas e apelos passionais, desequilíbrios de quem anda na corda bamba e merece o frio na barriga dessa problemática vida. Uma possível grande amiga minha, caso em surto ou TPM não estivéssemos as duas, imagino. Se toda mulher é um pouco Leila Diniz, acredito eu que uma minoria mais feliz ainda é dotada da sorte de ser que seja um pingo do que é Maria Elena. Interessantíssimas, insanas, sedutoras. Insubstituíveis

domingo, 8 de julho de 2012

Despedaço


Podia ser soluço, fenômeno que me ataca com frequência e se instala por quase um dia quando vem. Demora muito pra essa angústia passar? Eu que me pergunto, eu que não sei as respostas mesmo, oras. Enquanto tudo tá lindo & maravilhoso, parece que nunca mais aquele choro fungado que dá dor de cabeça depois enquanto eu digo baixinho "por favor, fala comigo. por favor, por favor". Cansada por um dia inteiro depois dessas batalhas que tempos de crise nos despedaçam aos pouquinhos.

Sei lá, é meio como entrar no mundo das drogas, eu imagino. Viciante. Bola de neve, já que é inverno também (e não a igreja). Mesmo quando um dos lados (quase sempre eu) acorda assustadiço aí pelas 5h40 da manhã pedindo um abraço, dez abraços, cem milhões. E feito criança no berço que não solta o dedo da mãe, adormece sem desgrudar - foda-se o desconforto físico, é o emocional que precisa de calor humano pra se sentir vivo de verdade. Vai se deixando algo mal resolvido ali, no caminho qualquer outra coisa que deveria ser dita e não foi, e ok, a pressa é tanta em ficar bem que daí, depois, o acúmulo de frases não-ditas, sensações mal explicadas, comportamentos condenados.

É fase, todos dizem. Basta o sumiço. Tempo longe. Coisas desse tipo que devem fazer casais naturalmente felizes e tão diferentemente parecidos um com o outro voltarem a valer a pena. Quietinha, quietinha. A causa é nobre: liberdade e paz, e fuga. Pensamentos no lugar, o resgate de um soldado qualquer que um amontoado de brigas irracionais levaram à fuga dos momentos bons.

"A gente se ama, não adianta", num sussurro. "Tu tá quase chorando", debruçada assim no peito onde dói pra depois cair e escutar "Tô nada, jura" - os olhos cheinhos d'água salgada que não cai nunca, claro. Não caia há dez anos e há um fizeram do cara forte nos mais diversos sentidos que é quase minha fortaleza, gurizinho em choque que correu pra lá na praça, tão assustado. Nunca tão lindo.

Sei que vai passar porque toda vez que ensaio ir embora, abandonar a barca, ir pro esconderijo sem a mínima vontade própria, por puro drama mesmo, não consigo: não dá, não quero, me coloco em frente a porta e o vejo tirar os tênis e jogar a chave do carro longe. Anda difícil, mas desistir de nós dois é muito mais.

Clichê, mas amor sobrevive: acorda com preguiça do frio na cama quentinha, enlaça os pés, afaga muito e vê que tem sol. Entre loucura de ser feitos um pro outro e também não, a tempestade. Só passa se dividindo guarda-chuvas, culpa e o mesmo riso fácil dos concursos de quem desenha (pior) melhor; vencida essa fase, feitos pra sempre.

Importada



Essa não é uma história de estrangeirismos, amores clandestinos e nem mesmo de fugas para fora de si. Era uma vez uma menina que se importava demais. Mais ou menos assim: queria, ia atrás, conseguia e depois, mesmo com a conquista na palma das mãos, vestida no corpo, carimbada no coração, que nada: insegura, mãos suando e uma importância descabida a cada pequeno sumiço, tropeço, falta, fala. Frieza? Aqui, nesse pequeno pedaço de carne, sangue, órgãos, veias, fios e sensações, inexiste.

Era um importar tão apegado já a personalidade da criatura que, sendo objeto de afeto da mesma, ficava fácil sentir um pouco de sufoco por entre tão carinho, dengo, preocupação, necessidade por parte dessa mulher que parecia criança, imensurável o apego. Radicalista até mesmo, tão grande a importância de quem figurava no seu altar, trancafiado às sete chaves do íntimo mais lustroso, por entre as preocupações mais aflitas, solitária num desprestígio único - quis ser dona de todas as razões, verdades absolutas e ansiedades de suar mãos, tremer pernas e embrulhar estômagos. Diziam: racionalize, garota. Suma. Vá pra longe. Não responda, não se importe, não queira, esqueça de cuidar. Só assim que os outros continuam vívidos e alertas, sensíveis e atentos: afim.

Fez valer tanto o seu esforço em matutar nas riquezas sentimentais, ouviu muito a opinião alheia de todo mundo que pra ela, importava, e admitiu de cara lavada a falta de comodismo - era difícil disfarçar os impulsos (malignos, complicados, apressados e sempre errôneos), e então, ficou mais fácil admitir que se importava mesmo, talvez fosse louca, com certeza era um pouco paranoica e aflita. Mesmo quando via os outros largarem de mão, com pouca vontade e doação, sem espaço para respirar, exercitar o dorso reflexivo e conseguir demonstrar também o tal sentir, não conseguia distrair e ir a um shopping, assistir a filme sozinha ou comprar com certeza e sem arrependimento sozinha: enquanto sufocava todos e tudo que a ela tinha influência direta no dia, asfixiava a si mesma num masoquismo incompreensível a quem de fora desse mundo caótico estava.

E foi uma vez essa moça que ligou desesperada mil e novecentas vezes, mandou mensagem porque a saudade apertou, quis ver e participar de tudo, leu horóscopo, iching, psicologia comportamental, fez salão completo, compras impensadas e teve uma cabecinha com um furo meio oco que só conseguia deixar entrar falta de atenção ao que deveria de fato importar - trabalho, faculdade, amizades, leituras obrigatórias, enfim - para se abduzir num planeta onde a imaginação, tão fértil, dava diariamente flores cheias de espinhos que a faziam ácida feito limão mesmo depois de um shot de Tequila. Sozinha, se sentia uma pequena princesa com algumas rosas, longe do mundo real onde tudo funciona bem e as pessoas reais menos ainda que sentem. Decidiu: acalmar a mania de cuidado, voltar toda essa força carinhosa, transgressora, importante para si mesma que o retorno era certeiro e quase imediato. De importada a flor, do caos à leveza, do peso, até ser considerada sorte, dádiva, alegria, alegria. Acordou.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Reflexões de um horizonte, por Sarah Kane


 

Há mais de um ano (quase dois, acredito eu), caiu nas minhas mãos, por uma leitora do blog, o curta-metragem mais esplêndido que eu já vi. Sério, sem exagero. Nesse meio tempo, sempre quando preciso me sensibilizar ou quero lembrar o quanto é bonito o amor de verdade, seja ele imperfeito, complicado, confuso ou difícil (e na minha opinião, são mais bonitos ainda os romances que são um pouquinho assim), revejo e revejo e já até mesmo decorei as falas dos dois atores.

Escrito por uma genial Sarah Kane que viria a se suicidar logo depois, se tornou curta, virou vídeo pro Youtube e hoje arranca lágrima, arrepia os pelinhos do braço e nos faz ficar mais românticas do que o habitual, sim. Capaz até de emocionar os mais machões dos homens, fazer-nos lembrar do quanto é importante um sentimento lindo desses na nossa vida e levantar as mãos pro céu, sim!

Enfim, Reflections of a Skyline é doce, é terno, é forte e acho incapaz de mexer com quem quer que seja. Na breve vida que teve sua autora, que se enforcou com o próprio cadarço num banheiro público de Londres, criou esse texto magnífico, que é também peça de teatro e merece a apreciação de vocês.


"E eu quero brincar de esconde-esconde, te emprestar minhas roupas, dizer que amo seus sapatos, sentar na escada enquanto você toma banho, e massagear seu pescoço. E beijar seu rosto, segurar sua mão e sair p'ra andar. Não ligar quando você comer minha comida, e te encontrar numa lanchonete p'ra falar sobre o dia. Falar sobre o seu dia e rir da sua, sua paranóia. E te dar fitas que você não ouve, ver filmes ótimos, ver filmes horríveis. E te contar sobre o programa de TV que assisti na noite anterior e não rir das suas piadas. Te querer pela manhã, mas deixar você dormir mais um pouco. Te dizer o quanto adoro seus olhos, seus lábios, seu pescoço, seus peitos, sua bunda. Sentar na escada, fumando, até seus vizinhos chegarem em casa, sentar na escada, fumando, até você chegar em casa. Me preocupar quando você está atrasado, e me surpreender quando você chega cedo. E te dar girassóis e ir à sua festa e dançar. Me arrepender quando estou errado e feliz quando você me perdoa. Olhar suas fotos e querer ter te conhecido desde sempre. Ouvir sua voz no meu ouvido, sentir sua pele na minha pele, e ficar assustada quando você se irrita. Eu digo que você está linda, e te abraçar quando você estiver aflita, e te apoiar quando você estiver magoada, te querer quando te cheiro, e te irritar quando te toco e choramingar quando estou ao seu lado. E choramingar quando não estou. Debruçar-me no seu peito, te sufocar de noite e sentir frio quando você puxa o cobertor e sentir calor quando você não puxa. Me derreter quando você sorri, me desarmar quando você ri. Mas não entender como você pode achar que estou rejeitando você quando eu não estou te rejeitando, e pensar como você pôde pensar que eu te rejeitaria. E me perguntar quem você é, mas te aceitar do mesmo jeito. E te contar sobre o "tree angel", "o menino da floresta encantada" que voou todo o oceano porque ele te amava. Comprar presentes que você não quer e devolvê-los denovo. E te pedir em casamento, e você dizer "não" denovo mas continuar pedindo, porque embora você ache que não era de verdade mas sempre foi sério, desde a primeira vez que pedi. Ando pela cidade pensando. É vazio sem você mas eu quero o que você quiser e penso. Estou me perdendo, mas vou contar o pior de mim e tentar dar o melhor de mim porque você não merece nada menos que isso. Responder suas perguntas quando prefiro não responder, e dizer a verdade mesmo que eu não queira, e tentar ser honesto porque sei que você prefere. E achar que tudo acabou, espera só mais dez minutos antes de me tirar da sua vida. Esquecer quem eu sou e me deixar tentar chegar mais perto de você. E de alguma forma, de alguma forma, de alguma forma compartilhar um pouco do irresistível, imortal, poderoso, incondicional, envolvente, enriquecedor, agregador, atual, infinito amor que eu tenho por você." (KANE, Sarah)


(Não, o texto NÃO é meu e quem compartilhar por aí com o meu nomezinho vai ter seu pé puxado pela real autora quando for dormir. Sim, eu choro todas as vezes que assisto, não consigo me controlar. E é, talvez não seja novidade o vídeo pra muita gente, mas espero ter encantado alguns que infelizmente ainda não conheciam.)

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Desastrosos elogios



Desisti de elogiar as pessoas. Simples. Sempre li por aí nesses livros sobre comportamento humano que, numa briga, momento de fraqueza, ou mesmo grandiosidade alcançada pelo outro, enaltecer as qualidades e falar o que gosta no outro, deixar às claras uma admiração até então não sabida fazia bem. Só que não. Pelo contrário: dava espaço a um relaxamento que nada tem a ver com a atualidade de relacionamentos, profissionalismos e cuidados básicos. Elogiou? Carregue consigo uma certeza que mais tarde se transformará em culpa, pra depois se tornar frustração e quem sabe um dia, arrependimento. Desdenhosos, os elogiados.

Às vezes, não precisa ser diretamente pra pessoa. Percebo que essa tendência no ar a diagnosticar o lado bom, as melhorias, o bônus e a parte boa alheia, por simplesmente comentar com uma amiga, escrever no diário ou cair na real do quanto fulano está sendo generoso, o namorado é o melhor do mundo, a mãe anda uma santa e, pronto: o mor resolve que o namoro não anda lá essas coisas, as pragas maternas voltam com mais força que nunca, e a fase fica complica também no terreno amistoso da coisa. Um nojo. Saída da mente, é como se enviada uma mensagem, sinal, indicativo que informe o outro: "desleixe, está ganho" ou "agora pode parar de se empenhar em ser bom o bastante, vamos ver se ela aguenta o tranco". O que não, porque nem sempre, como diria o sábio Amarante. Fica fácil se sentir idiotíssima por ter cagado tudo ao exaltar um momento positivo que vai tão logo veio e sai de cena depois de representar apenas o primeiro ato.

A gente eleva queridos, terceiros, outrem pra depois cair na conclusão de que as pessoas, assim como o mundo, não giram no lugar e colhem mudanças (desejadas, ou não) de cada situação, embaraço, queda, susto; tudo vira motivo pra aprendizado. É engrandecer o melhor de quem andava se esforçando, andando na linha, agindo conforme o script pra ter a desagradável surpresa de se sentir pequenininha e acuada ao não saber mais como agir e quem é aquele ali que a gente conhecia tão bem e agora não sabe mais? Poxa.
Assim é com relacionamento indo bem no dia-a-dia, relações familiares caminhando em paz, as amizades num otimismo de dar gosto. Só não dá pra elogiar muito. Um carinho aqui, outro mais lá adiante, de vez em quando, alternado e bem dosado, é benéfico, recomendável, totalmente a favor de uma sociedade feliz, mútua. Em conta-gotas, talvez, funcione melhor: o de sempre perde a graça, acaba com o próprio crédito. Pras vezes em que couber, mais crível, surpreendente, aceitável. Só vale é ser nunca, ou o mesmo que creditar o voto pra um mundo onde a frieza consiga instaurar regime e nos faça reféns dessa violação de uma alma mais leve depois de ouvir palavras certas. Peço, encarecidamente: não.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Astronomia



Esqueço rápido as maravilhas de horas atrás, a conversa despretensiosa sobre frutas e comidas favoritas, cenas de infância e sobre ser eu uma boa mãe ou não, Eurocopa, coisas banais e leves que combinam com um sábado cansado co...mo foi o nosso. A culpa não é minha de tanto girar por entre os detalhes e os por vir aí, o medo da efemeridade dos relacionamentos - hoje, líquidos - e toda essa beleza que passa quando a gente se abraça e são recém 22h20. E não se larga, gruda pé no braço, espia pelo espelho o silêncio concentrado, ri do jeitinho (sempre tão unique) do outro, essas coisas de quem é apaixonado e ponto.

Só que eu penso demais, é isso. Dá um medo danado de acordar de manhã e ter um acidente, esses sumiços de vez em quando porque o dia é puxado e quase engole, de se perder e nunca mais se encontrar no abraço apertado onde me sinto tão e sempre em casa, aliviada, mais confortável num mundo que condena essa minha agitação autodestrutiva, algumas vezes em forma de impulsividade constante. Porque é nessas noites de fim de semana onde eu visto uma camisa largona e coloco meias brancas quentinhas, de pernas pro ar, que eu me permito uma autenticidade visitada apenas por quem conhece as constelações de pintinhas da minha barriga - e sabe apreciar.

E depois de amor declarado na surpresa, sono bom enquanto o a hiperatividade se fazia canalizada, escovar os dentes lado a lado, conversar antes de dormir e cair no sono, café da manhã com futebol na temática, leitura conjunta na sala e sol bom antes do almoço, é sair do carro e fechar o dedo na porta pro efeito Cinderela da minha paixão pensante compulsória começar. A falta que eu sinto só porque é domingo e tudo tem registro de quase quase perfeição começa. Assola. Minha paranoia começa a ter um efeito tão desgastante que nem mesmo a criadora - no caso, eu - aguento tanta loucura imaginativa. Às vezes o medo some, noutras vem em dose redobrada e sou sincera, digo logo, demora um pouco, a gente se acerta e passa: é fechar as pupilas e voltar pra calmaria de nós dois entrelaçados que o coração afina e os presságios voam como borboletas para fora dessa minha cabecinha já tão infestada. Assombrosa uma vida que não inclua o calção azul ou a calça molinha. Longe, eu sinto um temor de estimação que alimento com bobagens que não existem e são minúsculas se em combate a esse sentir tão bom, avivador, e completo que a gente sente.

Como é ótimo estar numa fase onde se entende tanto e conhece o outro como a palma da mão e os cantos do corpo, os sinais emitidos entre um olhar e o não-dito, sincronia que funciona de pensamentos e sentidos. Uma das mais maravilhosas fases, quase quinze meses de convívio direto: leveza, lazer, felicidade. Mas que ainda precisa de água, mimo e acalento diários porque quer ter certeza de que não é só sonho e de fato existe, faz raízes e um dia dá flor. Quer tanto mais dessa cumplicidade a dois, do tempo bem gasto juntos, do efeito sorriso imediato assim que se reencontram os olhos de cor praticamente igual, tranquilos. Por isso, reflito tanto e vasculho muito esse meu cérebro que não descansa quase nunca, tenho apreço pelo detalhismo e uma queda pela perfeição.

Reviso conversas, volto em momentos cruciais, checo bem minhas certezas e faço questão de baixar toda e qualquer expectativa. Seja em praia, noite fresquinha, festa lotada, choro compulsivo e o abraço mais performático desse mundo, te encontro cheiroso desse perfume que gruda sempre nas minhas roupas e beberia de canudinho, de possível. Com a cara de levado, de sono, de mau - que o amor é por todas, todinhas. Assim em paz, novamente certa de que é de dias assim que a memória matéria prima, toda feita. Ainda bem.