domingo, 8 de julho de 2012

Importada



Essa não é uma história de estrangeirismos, amores clandestinos e nem mesmo de fugas para fora de si. Era uma vez uma menina que se importava demais. Mais ou menos assim: queria, ia atrás, conseguia e depois, mesmo com a conquista na palma das mãos, vestida no corpo, carimbada no coração, que nada: insegura, mãos suando e uma importância descabida a cada pequeno sumiço, tropeço, falta, fala. Frieza? Aqui, nesse pequeno pedaço de carne, sangue, órgãos, veias, fios e sensações, inexiste.

Era um importar tão apegado já a personalidade da criatura que, sendo objeto de afeto da mesma, ficava fácil sentir um pouco de sufoco por entre tão carinho, dengo, preocupação, necessidade por parte dessa mulher que parecia criança, imensurável o apego. Radicalista até mesmo, tão grande a importância de quem figurava no seu altar, trancafiado às sete chaves do íntimo mais lustroso, por entre as preocupações mais aflitas, solitária num desprestígio único - quis ser dona de todas as razões, verdades absolutas e ansiedades de suar mãos, tremer pernas e embrulhar estômagos. Diziam: racionalize, garota. Suma. Vá pra longe. Não responda, não se importe, não queira, esqueça de cuidar. Só assim que os outros continuam vívidos e alertas, sensíveis e atentos: afim.

Fez valer tanto o seu esforço em matutar nas riquezas sentimentais, ouviu muito a opinião alheia de todo mundo que pra ela, importava, e admitiu de cara lavada a falta de comodismo - era difícil disfarçar os impulsos (malignos, complicados, apressados e sempre errôneos), e então, ficou mais fácil admitir que se importava mesmo, talvez fosse louca, com certeza era um pouco paranoica e aflita. Mesmo quando via os outros largarem de mão, com pouca vontade e doação, sem espaço para respirar, exercitar o dorso reflexivo e conseguir demonstrar também o tal sentir, não conseguia distrair e ir a um shopping, assistir a filme sozinha ou comprar com certeza e sem arrependimento sozinha: enquanto sufocava todos e tudo que a ela tinha influência direta no dia, asfixiava a si mesma num masoquismo incompreensível a quem de fora desse mundo caótico estava.

E foi uma vez essa moça que ligou desesperada mil e novecentas vezes, mandou mensagem porque a saudade apertou, quis ver e participar de tudo, leu horóscopo, iching, psicologia comportamental, fez salão completo, compras impensadas e teve uma cabecinha com um furo meio oco que só conseguia deixar entrar falta de atenção ao que deveria de fato importar - trabalho, faculdade, amizades, leituras obrigatórias, enfim - para se abduzir num planeta onde a imaginação, tão fértil, dava diariamente flores cheias de espinhos que a faziam ácida feito limão mesmo depois de um shot de Tequila. Sozinha, se sentia uma pequena princesa com algumas rosas, longe do mundo real onde tudo funciona bem e as pessoas reais menos ainda que sentem. Decidiu: acalmar a mania de cuidado, voltar toda essa força carinhosa, transgressora, importante para si mesma que o retorno era certeiro e quase imediato. De importada a flor, do caos à leveza, do peso, até ser considerada sorte, dádiva, alegria, alegria. Acordou.