sexta-feira, 4 de março de 2011

Venusiana



Há em mim um lado tão humano, que necessita doação: é caótico, transgressor. Quer de mim partir, porque deste ser e coração tudo já sabe, do íntimo é cúmplice. Com a precisão dos sábios, espera e fatidicamente, age. Em busca do encanto primário, do toque de olhos que de tão necessário, faísca. Abnego o eco das tantas frases que digo, apenas para que, em segurança, escutes. Desbaratino em tanto querer prover, nos ínfimos detalhes para cuidar da perfeição de um momento, uma ligação, que aos poucos entrego ouro e pedras raras, moedas e significâncias. E é nessa entrega, que me devolvo o prazer de estar viva e sentir o peito quente, o sangue pulsante. É quando me torno complacente e cordata, passível de ser contornada e por fim, dobrada; é no amor completo que me sinto em casa, de chinelo nos pés e camisetão. Inteiramente em paz.
De tanta dedicação, me pergunto: como há tanto ainda também, por se esvair e libertar? Da fraqueza feita força, talvez. Nos restos de tanto escrúpulo e mala gente, o doce desejo do amor romântico real, absoluto. Bem vivido, apreciado: crescente. Da benevolência que insiste existir, a ardência de se ver em cada casal de filme, de arder em cada momento de paixão. A coragem de desbravar por inteiro um interno mundo até então, misterioso. Projetar o inexistente, idealizar o que de maneira mais simples, ao meu querer se adeque.
Não que seja simples, todo o encanto, a tal sedução que ensaio: é raro. De uma delicadeza de pôr no colo e embalar canções. Porém, escorregadia: se escassa de sonhos, e chamegos de manhã, cortejos e alas abertas, me escondo, me fecho: mutável, calada. E de santa, passo a ser fada delicada que o mundo sobrevoa. De fada, flor que beija: pássaro que pelos campos se distribui e nisso vê sua felicidade concreta.
Fecho as janelas, e logo as venezianas. Já foi longe a imaginação, e o chão a ser percorrido, é agora o do sono. Uma noite em Veneza, talvez. Baile de máscaras, passeio de gôndola, um beijo lírico em cima da ponte: pelas emoções que desaguam, límpidas. Em meu Romeu.