sábado, 11 de junho de 2011

Ao frio que tanto odeio



Agora que você já veio, me fez descer do armário as roupas que não gosto tanto e nem exibem como de fato é minha silhueta, além de uma gripezinha aqui, em conjunto a algumas tosses furtivas acolá, já pode ir. Pra que durar tanto tempo? Quase seis meses em que nos vemos degradar aos poucos de cor (a pior parte é a pele morena ao gelo, e por fim, ao bege quase pardo), parecer mais acima de qualquer peso, e vestir camadas e camadas de roupa - é quase ver se ir com a ventania ferrenha aqui os cuidados e caprichos tão cadenciados com a estética, na fase agradável do ano (leia-se: verão e primavera). Os dias cinzentos e aquela vontade desoladora de ouvir o repertório para cortar os pulsos, mesmo com a felicidade ali, na manga; palpável e absoluta. Nostalgia, nó no peito, vontade que só o cobertor de orelha tem capacidade de extinguir. As mãos congelam, e pedem luvas. A boca racha, e clama por manteiga de cacau, protetor solar, batom ou qualquer coisa que não deixe sangrar. Os cabelos, ou ressecam, ou se permitem o oléo que no verão não existe (tão bem faz a água gélida tanto a pele, quanto a fios. Impossível no inverno). Você quer tomar banho, e quase congela. Entra no chuveiro, e pretendo morar submergida na parte aquosa do banheiro. Sai, e é logo invadida pela friagem novamente. Fortes sensações, essas da temperatura baixa. Há que se ter coração forte, vontade empunhada e um tanto de saúde em dia, com certeza. Salvam e aquecem: café, chá, chocolate quente, foundue e sopa.
Na hora de sair, mais aperto. Se não for de guerra, bem possível que a vontade de ficar debaixo das cobertas, quentinha na cama, impere. Quer se sentir sexy? Complicado. Não esqueça o casacão por cima: uma obrigatoriedade, claro - e que ficará na chapelaria de qualquer casa noturna que você invente de entrar. Tentando sensualizar, você treme. Fala, e é possível ver no ar a fumacinha que faz cada sílaba proferida. Dia de prova no ápice da estação: espirros, catarradas, narizes que escorrem, e logo mais, são assoados. Repugnante, um nojo. O sono aumenta, assim como a fome. E os alimentos? Todo um arsenal que pede que a dieta seja interrompida já, no presente momento. Densos, com milhares de substâncias capazes de a fazer perguntar, quando chegar a primavera: cadê aquele corpinho enxuto e até mesmo tostado antes de toda essa parafernália começar? Se enfurnou dentro do armário, com as peças que realçam as curvas e apoderam a auto-estima que agora se esconde por trás de meias-calças grossas e blusões de lã. Coloque uma touca, está terrível lá fora. Que mão gelada, está agasalhada? Compre um par de luvas. Durma de meia, os pés se aquecem mais rápido. Aliás, o sono, esse vilão: quando fortemente por nós pego, difícil de largar. Despertador que toca, toca e toca, e você ali pensando: só mais oitocentos e noventa e dois mil minutinhos, por favor. A vida chama, não dá. As responsabilidades, além de prosseguirem, teriam que se adaptar ao slow motion que é viver quase congelando a todo instante. Ou pior: se ambientando no quentinho de casas, bares e ambientes, e tendo que enfrentar o ar gelado que bate na face. Dualidade demais pra quem não se divide quase nunca.
Acha de bom grado conviver com as quatro estações? Troque comigo. Venha viver na pele - e adoecer, possíveis são todas as doenças respiratórias e alérgicas de se adquirir ao menor sinal de imunidade baixa - esse looping de sensações térmicas que me abriga. Só não tome vinho demais, que este até aquece e alegra o momento, mas um adendo: no outro dia, a dor de cabeça é grande e a tontura, uma consequência. Já que veio, pode ir. Mostramos nossas botas, vestimos todos os casacos do armário na tentativa de não repetir e usufruímos das enfermidades, caldos, sono pesado e degradação corpórea infernal dos dias inertes. Falta muito pro suor escorrer na face ou embaçar o óculos na praia, e pro povo se permitir algumas vulgaridades que só o verão nos dá? Que venha. Logo.