sexta-feira, 29 de abril de 2011

Desequilíbrio



Difícil. Umas explosões, um caos e gritos altos e agudos, portas que batem, se fecham e só mais tarde voltam a se abrir, dando espaço aos passos pequenos e leves de arrependimento e culpa. Pela manhã, podia me classificar mal-humorada; acordada às avessas, e sem meu livre arbítrio, perdido entre o barulho das crianças, e a televisão no último volume. Uma hora de sol e um banho mais tarde, estava eu serena. Calma e cordata como uma ovelinha filhote, desconhecendo que ficaria careca no verão e serviria de alimento humano, mais tarde. É o caos a ordem da natureza humana, saibam. Continuei com minha tranquilidade estranha à tarde e agora pela noite, me invade um sentimento literário, uma vontade de ser gritada e ouvida, e de falar tudo que penso, o que em vem à cabeça, e as angústias, a vida, essa confusão em paralelo.
Se essa semana me pede silêncio e compreensão, me resta desabar em palavras, letras, pontuações e alugar os ouvidos da minha querida mãe, que sempre tem uma observação analítica capaz de me fazer pensar o resto do dia. Como quem sai de um consultório de um analista, e ele sempre povoa pensamentos distintos ou minhocas em multiplicação na mente humana. A coitada só não se especializou nessa área por falta de estudo, porque capacidade, não posso negar que não exista. Com a cidade vazia, tenho poucas opções para compartilhar esse meu desatino, ou quaisquer opiniões. Tento me verter nos livros, que já releio pela terceira ou quarta vez ou em novas frases, que procuro virtualmente dos meus leitores mais desconcertantes.
E não me fazem mudar de idéia. Quase ninguém. Pensei por tais horas, no que li de Tati Bernardi, e que ela mesma deve ter retirado de algum desses livros de auto-ajuda, que diz genericamente, que quem deixa saudade nos pensamentos e coração masculinos, são as mulheres equilibradas. Discordo. Não para benefício próprio, e assim, tentar me iludir de que os caras adoram essa dualidade e o meu instinto impulsivo e bipolar. Longe disso. É só que, eu vejo muito mais do que só essa frase.
É só que comigo, acontece justamente o oposto. Meus melhores relacionamentos, ou até momentos, não foram cheios de palavras nas horas certas, e movimentos corretos, tudo como o esperado. Até acho que, nenhum relacionamento meu, que começou dessa maneira, decolou. Mesmo que eu tenha uma relevante inclinação para o louco, e homens e mulheres sejam opostos. Como gostar daquela que fazia tudo certinho, meio-termo, se deixando levar e respondendo como o imaginado? A maioria da raça máscula gosta de surpresas fora de hora, alguns sentimentalismos e daquelas que não deixam pra trás seus valores e princípios. Nada mais apaixonante do que uma criatura que faz tudo ao contrário, mas com força, determinação e sentimentos. De fria, já basta a água no inverno e a comida requentada. Existe, se envolver com alguém que faz tudo quando convém, que não dá uma enlouquecida vez em quando, ou não aumenta a voz, quando o assunto em questão é de seu interesse, e opinião?
Homens assim, ainda guardam o machismo de épocas atrás, onde a mulher vivia submersa na submissão, e seu habitat se bastava à casa, quintal, cozinha e área de serviço. Não condiz com a liberdade que hoje existe, e a maioria das famílias exerce. Hoje, o amor está naquilo que não conseguimos decifrar. No que nos é incodificável, não traduzido. Atitudes incertas, frases sem sentido, olhares fugazes, e pouca lucidez. Porque, de boas pessoas, honestas e não fumantes, o planeta tem aos montes. E quantas e quantas dessas, solitárias. O que apaixona não é o certo, a incógnita. A esfinge. Aquilo que não corresponde, e estraga. Que não se define, mas se vicia. Mesmo que canse, em suma, com o tempo todos se adaptam ás mais doidas manias e complexidades.

(Janeiro de 2010)