quarta-feira, 25 de maio de 2011

Não namorável




Que os homens curtem ver revista de mulher boazuda e passar cantada fraca em menina gostosa na rua, já estamos cansadas, de tamanho o saber. Agora, missão praticamente impossível é esta: se comprometer, afetivo e emocionalmente com um mulherão. Tarefa para poucos, vocação para raros. Desafio para alguns, que até o fariam de boa vontade, mas instinto para tal empreitada não possuem.
A moça pode ter uma autenticidade invejável. Fala o que vem a cabeça, faz só o que está afim, e melhor: dá liberdade. Quer sair com os amigos? Vai. Não pode hoje? Tudo bem, tenho outros planos. Possui vida própria que não a dele, e não pressiona por nada, nunca: vai no ritmo que a banda do garanhão toca. Tudo muito bem, completamente bom. E sabe: não passará disso. Nunca. Entrada para o hall das donzelas selecionadas para se exibir como "namorada": proibida. Enorme a cumplicidade, ótimos os momentos juntos, se pergunta então: por que?

Justo porque além de não se frear, ser esperta e por vezes, um pouco impulsiva, ter um ciúminho pequeno e mudar de humor a cada hora do dia, nasceu graúda. Desde sempre, voluptuosa. Com direito a coxa, peito - às vezes, braço - e derrière avantajados. Mesmo lutando frente às tantas barreiras para mostrar que poderia sim, ser considerada inteligente (piora se for bonita, a batalha será eterna), ter um senso de humor refinado e culto além de ser bonitona, não: quem mandou ter essa genética de passista de escola de samba? Que fique um fiapo, que se arranje com um bombado, que seja apenas para ver ou sexo - ela não é de cera, mas é como se fosse. Pode não falar com voz de retardada, e saber de cor e salteado todos os escritores franceses de maior influência na literatura brasileira. Pergunto: de que adianta, se, o corpo - tão visual, tão chamativo, tão luxurioso - quase berra pra que ela seja considerada apenas objeto, símbolo, fetiche, e não alguém pra se passar o domingo num parque qualquer, com a família? De nada.

O modo hipócrita como alguns caras ainda categorizam as mulheres nos dias de hoje é esdrúxulo, chega a ser revoltante. Mignon, rostinho de anjo, gestos delicados e faculdade tradicional: para namorar. Com aliança, e tudo. Planos de casamento, lua de mel extendida fora do país. Pra levar nas festas de família e da empresa, restaurantes refinados. Agora, experimente ter quadris largos, cintura fina e esbanjar languidez. Fale demais, pense de menos, e aja sempre. Curse o que te der prazer, tenha uma loucura de estimação e milhares de amigos homens. Ficam com estereótipos Sandy de mulher, desejando ardentemente que Juliana Paes e Scarletts Johansons apareçam para trovejar um pouquinho a infinidade dos dias. Infelizmente, a covardia masculina te levará apenas para casa, para cama e para pequeninos lugares, afugentados das grandes agitações e pessoas influentes da cidade. Conhecer a mãe? Loucura, garota. Ou você quer que a fêmea que o amamentou até os seis meses a conheça e logo imagine a selvageria que deve (ou às vezes, nem rola) entre quatro paredes? Não, não. E nem quer o cunhado e o pai fantasiando sobre você assim que puserem os olhos quando você entrar na sala. Porque, sabe: você é para ver, mas ele que tem a experimentado quer que o prazer seja próprio, apenas privado a si. Mas a sociedade, os parentes distantes e amigos de escola não precisam, de jeito nenhum saber da iguaria que o querido encontrou, e agora, enrola para continuar mistério.

Pior de tudo, é que pode haver sentimento, sim. Conflituoso a um medo de assumir para todos que anda por aí com uma gostosa de parar trânsito, aeroportos e olhares masculinos. Aditivo, o ciúme em saber que é notada, em tudo quanto é canto (mesmo no barzinho da esquina onde a leva). E mais: a desconfiança de que, cortejada demais, fértil em abundância, deve trair. Como confiar em quem seduz assim, espontaneamente, mesmo descabelada, de coque baixo e calça de moletom? Não consegue, não vai adiante. Esses são os frouxos, inseguros e palhaços que mais tarde viram piada no picadeiro das rodas de conversa feminina: o babaca que não assumiu nada por ela ser apetitosa em demasia. Homens que estão fadados a casar com a sem-gracice, e pelo resto da vida, correr atrás dos risos ofegantes de quem se entrega à volúpia de viver. Gostosa, ou não.