quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Essa pressa futilmente preenchida



- Eu só quero um par de sapatos vermelhos novos, um perfume novo e uma correntinha de ouro, pode ser só um C, ou meu nome. Só isso, e quantos sorrisos mais você quiser.
- Acho que tu deveria querer ser feliz, em primeiro lugar.
- Quero isso também, mas não dá pra comprar. O que o dinheiro paga são essas três coisas que andam me faltando, em futilidade. E podem me fazer feliz, quando no meu corpo.
- E amor, você esqueceu do amor, então? Achei que era primordial, amar e ser amada. E todo aquele cenário de contos infantis que você desenhava no ar.
- Não esqueci, só não sinto mais afeto nenhum. Não como antes. Temporariamente, fechei as portas.
- Como quando?
- Como eu nunca consegui em outras vezes.
- Eu te vejo mais complacente, engolindo a vida como quem come algo que detesta, mas não feliz. Depois tu fazes sempre aquela cara de quem come e tem náuseas, quer botar pra fora.
- Por isso, que eu reclame tanto, talvez. Tenho essa mania de querer gritar pro mundo o que tá errado, aquilo que não funciona. Mesmo que a minha voz não ultrapasse nem mesmo a janela do quarto.
- E olha que a sua voz é alta mesmo. Taí, verdade. Mas você não pode perder aquela coragem pueril de quem não pensava e agia. De quem ia sem medo nenhum, em frente, com o coração na mente, e nas mãos um celular.
- Assim era só pro que me tocava fundo. A quietude como resposta apenas pro que não me estremecia a base, não tirava do centro, não me dava suspiros vespertinos. É fogo ou frio, tu sabes.
- E agora, em que temperatura se encontra?
- Num verão que ainda nem nasceu. Querendo ser vanguardista, mesmo nem saber aonde isso dá. Se dá pé, dá fruto, ou planta dor. Mas quietinha e deixando o sol banhar com alguns raios aleatórios o corpo em biquíni, verão.
- Ainda é primavera.
- O mormaço também queima, meu bem.
- E o sapato vermelho, a corretinha dourada e o perfume, ainda são teus desejos destemidos? Tudo isso, pra quê? Desnecessário.
- Um sapato pra de um ângulo acima poder ver a vida, a correntinha pra ter algo valioso perto do peito e o perfume pra mudar de ares, já que nada acontece e as coisas não preenchem toda essa minha pressa desajeitada de abraçar o mundo.