quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A cola

Se prolifera nos mais inesperados casais, mas se bem atentos a gente quase nem nota. Justificam como amor incondicional, vontade intensa de se estar junto, desejo maior entre todos os queres possíveis. Nasceram grudados? É lógico que não. Tanto que, ela é leonina, e ele, capricorniano. E o que deveria ser cumplicidade, acaba se tornando grude: se não se veem todos os dias, ela surta. Caso ele vá num churrasco com os amigos à noite, ela pira. E se ela resolve ir num pub com colegas dos tempos de colégio? Ele enciuma. Vão às compras juntos, começam a estudar na mesma universidade, almoçam no mesmo lugar e jantam senão na casa de um, na do outro. É a tal cola que, no começo parece aconchego, mas com o passar dos meses se torna só sufoco.

Os outros incompreendem tamanha ligação inseparável. É uma demonstração excessiva de carinho em público, quase sempre cheia de nhe nhe nhe's e diminutivos em demasia, deixando enjoados com tanta carícia quase todos que se fazem presentes em tais momentos. A vida própria de cada um parece não mais existir. Só falta ele começar a assistir as sessões de depilação da moça, e ela, se meter nos momentos de privacidade dele no banheiro. Perde-se o contato com amigos mais agitados, entes queridos, o mundo entorno. No começo, o desligamento mundano parece uma anestesia contra as chatices que a gente é obrigados a enfrentar. Por um tempo, acredito que seja estável estar praticamente acorrentado por espontânea e livre vontade ao lado de quem se ama. Até que a mesmice pega com tudo. E aquilo que parecia o melhor vício adquirido, começa a se tornar uma obrigação. Perde o brilho inicial, o cheiro de novo, o estigma de novidade dentro do que é costumeiro. E um dos lados nunca compreende bem porque tanto abatimento ao se estar preso num mundo paralelo e que não acompanhas as piruetas travestidas de mudanças que a vida da gente dá.

O tempo para um respiro solitário só faz bem. Algumas horinhas para se sentir completa na própria companhia, idem. Renova a saudade, faz valorizar o quanto é importante e deve ser prezada a companhia com quem apenas faz de nós pessoas melhores, dá um gás para que voltemos loucos de uma falta que precisa ser preenchida somente com quem sabe a senha exata para fazer da nossa existência leveza. Sem grude excessivo, mas com vida própria o bastante para compartilhar a cada segundo quando unidos num mesmo momento - sem a necessidade de ter, mas de poder sentir, mesmo que longe, que um sentimento existe e não vai acabar tão assim prematuramente por se avançar cedo demais algumas etapas necessárias. Pressa para o que é durável e infinito: ainda bem que eu não tenho.