sexta-feira, 4 de março de 2011

Sem caio, rosas.


As homenagens são tantas, e fico aqui em branco, sentada, pensando exatamente em como começar. Existe isso de não haver conhecimento algum, nenhum toque ou olhar, nenhum autógrafo em primeira página, e ainda assim, sentir por inteiro o que em anos passados sentiu? Acredito que sim: pela memória eternizada em livros e escritos, vídeos e fotografias. No patamar de sílabas e emoções, experiência e palco da vida, Caio foi rei. Em externar sentimentos como quem desata todos os nós internos: da delicadeza que ocasionalmente acometia as palavras de Caio, do peito inserido por entre vírgulas e predicados, da força brutal de seus escritos nesse cotidiano já tão defasado de banalidades. Há uma quinzena de anos, Caio se ia. Num piscar de olhos, se foi. Eu, talvez, com meus sete anos, pedisse a chupeta que esquecia em casa quase sempre, já no carro. Ou eu criança precoce, treinando a fala e correndo com as perninhas curtas e grossas pelo mundo à fora que nem sabia ser tão grande, mas que é enorme. Ainda assim, Vitória, um ovo de cidade. Quase ervilha. Cidade grande com ar interiorano. Tão longe da cidade, dos gaúchos.
Três anos atrás, a descoberta dessa literatura que nos engole pra dentro, de Caio. Vício imediato. Paixão pelo mistério de em outras épocas, anos antes, alguém sentir o mesmo e colocar para fora da forma mais angelical que encontrou: sublime. Do jeito único de se reencontrar, que era escrever, e encontrar mais uma multidão de admiradores que são sensíveis e nas linhas captam a magia de apanhar todos os pedaços e seguir na vida, inteiriços do feitiço do mago Caio. Queria ter como sorte poder visitar o Menino Deus, e sentir no balanço de cada uma dessas árvores que assistem, um rastro da sedução lustrosa que pelo caminho, o rei eterno da introspecção deixou. Nas ruas do Centro, onde habitou e transitou diurnamente, em cada esquina, um resquício do que pode ele ter contemplado. Uma visão que pode ter inspirado o glorificado monarca da minha (e de tantas) prateleiras, soberano. Amigo íntimo a que não viemos, a maioria, conhecer. Sem apertos de mão, sem nem mesmo a ultrajante cabeça pensante em seus debates filosóficos, suas entrevistas polêmicas, para observar como agora anda esse mundo que vivemos. Igual: o conselheiro a que tantos nos reconhecemos, um ícone.
Hoje, em homenagem a este que tanto admiro, e nem mesmo posso contatar (telepatia, talvez? Profundos pensamentos, para que cheguem talvez ao céu ou ao paraíso, onde com certeza se encontra Caio) tentarei um dia, como em seu aniversário, um dia de paz interna. De chá no meio da tarde, jazz e blues ao pé do ouvido. Cometer uma loucura, pequena que seja, para sentir a vivacidade no sangue. Nomear objetos, pegar um avião e sumir por aí. Entrar dentro de cada um desses personagens que por nós passam, e a sensibilidade despercebemos; o fino traço do rosto, a exatidão dos gestos. Desvendar pessoas. Declarar paixões. E rosas. Como em seu aniversário, uma visita com direito às mais vivas e robustas rosas que encontrar no caminho. Bem cultivadas, duradouras, para colocar ao lado da foto em preto e branco. Tudo pela genialidade desse Caio que nos atinge em cheio, e quase nos pega no colo, em cada reflexão perspicaz. Inspira e traduz almas e afeições. Tenho certeza que Deus já o tem lá em cima, junto aos anjos e a um céu tão azul que o faz o mais feliz dos querubins. Desses que assistem e enviam axé, força e fé a todos nós que sentimos demais e com complexa atenção os dias, na ponta dos dedos. Viva Caio, que deixa cada dia nosso mais doce.