quarta-feira, 9 de maio de 2012

Vida de gente grande

 



Confesso que ainda não sei usar a máquina de lavar roupas. Os tantos botões, onde jogar o sabão em pó? Programa de lavagem a ser escolhido, tempo, potência, sei lá: tudo complexo demais. As mais delicadas vai a mão mesmo. Desse caminho de níveis elevados a cada um vencido, dos obstáculos de correr contra o tempo, fica na paisagem o verde indo pra trás, com tanta coisa caindo por terra: tá tudo quase quase quase maduro. Demora pra aceitar, mas o ruim pinta na vida como um alerta pro quanto não cabemos mais dentro dessa versão praticamente ultrapassada nossa que merece reajustes.

Sinônimo da palavra amigos torna-se "poucos e bons" no dicionário próprio. Desperdiçar confiança por aí com quem não merece nem ao menos um pingo se torna lei. Afinal, os monstros estão a solta, e muitas vezes possuem pele, osso, nome, sobrenome e uma maldade assustadora - debaixo da cama, apenas algum sapato esquecido e só. Até o abajur a gente aposenta. Trocar a tranquilidade de um barzinho, jantar, cinema pelas antes recorrentes necessárias baladas, uma boa opção. Decidir, e ter planos, mesmo ainda não tendo, de viver sob um teto todo seu, pequeno e apertadinho, mas onde possa pintar uma parede de carmim, outra de lilás, fazer o que bem entender e levar quem quiser. Tem a ver também com começar a escolher a própria comida e se, a oferecida não satisfizer, estar disposta a pagar por isso. Aliás, dinheiro é um tema que muda bastante na nossa cabecinha antes, tão oca. Contas e mais contas com nosso nome sobrenome começam a brotar no correio. Cartões de magazines e crédito, internet, celular. Dói ver o dinheiro indo praticamente pelo cano. É terrível ficar em filas todo santo começo de mês. A vida de gente grande nos suga todo dinheiro, pede orçamento e nos faz atentos ao que comprar ou não, qual a melhor data, e, às vezes, pesquisar preços. Pra quem antes achava fácil ir lá e querer sapato novo, exigir maquiagem da melhor qualidade, uma roupa nova por semana, a mudança é grande. Gritante.

Os horários passam a ficar apertados. O trabalho vira algo que, além de nos sustentar, nos faz aprendizes - e é, então, essencial. Conciliar família, faculdade, namorado, estágio, exercícios físicos, loucuras próprias, projetos paralelos e cuidados de beleza é o grande desafio. Economizar, cada vez mais, é preciso. Amadurecer é ver menininha chorando por cada bobagem fútil e, por dentro, rir. Ter pena do vazio de uma vida onde se acha que sabe de tudo, mas que, logo mais se verá que nem mesmo o máximo que se pensava saber, não passa de um mínimo para sobreviver sozinha. É ir ao médico sozinha, se virar pela cidade também na própria companhia, catando enlouquecida ruas e bairros, avenidas e locais pedindo informação. A gente se torna também um pouco mais zen e deixa a serenidade, amiga esta, não só bater na porta, mas também entrar: se está tudo uma merda, que foda-se mesmo, mais ali na frente a gente sabe que melhora. Sentir o amor, cada vez mais próprio, na fala mansa que é cada vez menos eloquente e burra, para ser então pensante: ao invés de surtar e causar briga desnecessária, briga. Antes mesmo de ser a louca de até então, pensa. A ordem dos fatores muda, o resultado é melhor ainda: a luz no fim do túnel, cada vez mais próxima, tão claro na gente aquilo que é bom e importa: crescer dói, devem ter esquecido de contar as vantagens de uma vida mais libertária e independente a Peter Pan, só pode ser.