quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O dia em que eu saí de casa


Decidida. Era segunda-feira, dia de Miss Universo, e eu iria sair de casa. Ideia arquitetada já há dias na cabeça, conversada com os queridos mais próximos e enfim, peguei o ônibus, saltei na parada e entrei em casa confiante. Numa loucura de não ser pega em flagrante - odeio despedidas - arrumei feito participante de gincana as "malas" em que levaria, primeiramente, o necessário que poderia ser urgente: pega dali, vasculha de lá, dobra, amassa, joga, faz força para fechar. Ainda assim, tanta coisa. Praticamente uma vida num quarto: como transportar assim, em apenas meia hora, em algumas malas e num táxi chamado pelo telefone, até um lugar que o posso chamar de meu? Não sabia lidar, e até hoje não posso afirmar que aprendi.

Já não me sentia mais em casa na própria residência. À vontade no meu próprio quarto. As brigas eram constantes, e a melhor saída que encontrei, foi dar um tempo fora do ambiente que já me fez bem e então fazia mal (atitude até hoje incompreendida, mas que, imagino ter sido melhor, pensando em futuro). No dia que sai de casa não chovia, mas, torrencialmente, era sob minhas bochechas rosadas que vi cair uma tempestade. É tão complicado estar sozinha nesse mundo e contar com pouquíssimas pessoas - a gente deve escolher as melhores possíveis para que, entendam caso a gente enlouqueça, não rejeitem nossa solidão compartilhada, nem mesmo a carência que aumenta quantitativamente.

Se disser que me arrependo de algo, seria mentira. O tanto que amadureci comodidade nenhuma faz jus. Sou minha maior preocupação, até porque, se assim não for, fico à mercê da própria deriva. Sinto muita saudades, mas não é a mesma de tempos recentes. A independência que sempre existiu em mim achou hora para gritar - pena que o encontrou, antecipada, um lugar. Ou o melhor momento: alguma estabilidade. No meio do caos, mais um barulho para chiar numa comunicação onde as coisas já não fluiam como deveria há algum tempo. Ter que ser forte, mais que nunca fui, também tem me dado uma visão a respeito do mundo que antes nem cogitava ser compatível com meus ideias, minhas opiniões e bagagem cultural. Tem sido um ruim tão bom que, na verdade, são os ossos frágeis de um ofício árduo, que é se desligar do que nos estagna para nos conectarmos com aquilo que, a longo prazo, tende a apenas nos engrandecer.

No dia que sai de casa, nada foi paz: o carro ficou, o ônibus demorou, o banho em outra casa não foi dos melhores, a falta de companhia deixou o coraçãozinho apertado por instantes. Assisti à estupenda beleza das beldades que desfilavam de biquíni pela televisão num choro compulsivo o por me humilharem, caso ficassem ao meu lado numa praia, mas sim porque o estigma de pertencer ao mundo e, agora, não ter um lugarzinho que seja pra chamar de meu fez uma troca com outras (antes) tão "importantes" ideais dessa minha vivência. Me virando sozinha com a grana que ganho, vindo trabalhar sozinha, voltando da faculdade também solitária, é nessa mesma individualidade que tenho feito de dentro da fraqueza, força.